Rafaela
Durante o trajeto ajeitando a bolsa,pensava como cheguei aqui,nessa situação desonroza e dolorosa. O inferno acabaria hoje.
Depois de andar por algumas quadras das ruas de Lisboa, cheguei no pier,no lugar onde Miguel marcou o encontro. Ventava muitíssimo, estávamos perto do mar.
O mesmo se encontra de costas,suas roupas toda amarrotada, abraçando o próprio corpo. Ao escutar o barulho das minhas pisadas ele se virou na minha frente. Ficando numa distância segura.
Parecia que não tinha dormido a noite inteira,com uma expressão atormentanda no rosto.
____ Como você está?! ____ Internamente achei graça da pergunta.
____ Como você acha?Miguel. ____ Respondi e podia ouvir o rancor da minha própria voz.
____ Me diga você...minha Rafaela...
____ Nunca mais dirá isso! ____ Disse entre os dentes, apertando com força a bolsa contra meu corpo. ____ Já disse que perdeu esse direito quando me estuprou!! ____ Gritei com o coração ficando gelado, lotado de fúria. Jogando o corpo para frente.
Suas mãos foram para a sua cabeça e puxaram os seus cabelos usando bastante força. Em um gesto de loucura. Chorava e se tremia todo.
____ Me perdoe...por favor,eu estava fora de mim,aquele não era eu. ____ apontou o dedo para si mesmo. ____ Sou um imundo qualquer por ter feito essa barbaridade contigo...me perdoe...me perdoe...
_____ Para!!! ___ Berrei,livida. Chegando perto dele. Apontei o dedo na sua direção. ____ Você é o mais c***l dos homens,te odeio até os finais dos tempos...
Começei a chorar cheia de ódio desse desgraçado. Eu me debatia inteira por dentro,como eu desejava profundamente destruí-lo do mesmo jeito que fez com minha alma.
Sem clemência,sem piedade...da mesma forma que tais coisas foram negadas a mim. Eu almejava a sua cabeça numa bandeja de prata. Tamanha era o meu ódio por ele.
____ Eu não mereço perdão?! ____ Parecia sofrer muito. Olhava-me com desespero angustiado. Um homem atormentando pelo seu ato demoníaco.
____ Não! Merece ir para o inferno.... porque heim...que m*l eu ti fiz ____ As lágrimas caíram, em prantos angustiada,um sofrimento indescritível, incomparável...um tormento eterno.
O tempo parou por uns segundos, ouvindo as nossas respirações exaltadas. Não existia mais nada para nós dois,nossa história havia terminado.
Entreolhavamos com dores vindo direto da nossa alma, cada um sentindo da sua maneira. Ele pelo remorso, arrependimento...culpa e eu por tantas coisas...que somente com o tempo daria para explicar.
Dava para escutar os barulhos que os nossos choros faziam sem sessar.
____ Até o pior dos homens merece perdão, Rafaela...e tudo que vivemos, simplesmente deixou de existir? Vai jogar tudo para o ar? ___ Balançou a cabeça, apertando os lábios. Aproximou-se muito, eu tinha que agir. Então rapidamente saquei a faca de carne do meu pai de dentro da bolsa, pegando ele desprevenido ao apontar a faca na sua direção, segurando ela com as duas mãos. Ele congelou surpreso,mas não recuou. Parou bem perto o suficiente para acabar com sua vida miserável.
____ Você tirou tudo de mim! Quero recuperar a minha honra!Tirou a minha inocência, Miguel. Arrancou ela deixando-me manchada. Acabou com a minha vida. ____ Minhas mãos tremiam e as lágrimas rolavam, lavando a minha face inteira.
____ Quer me matar? Rafaela. ____ Havia dor nos seus olhos,vermelhos por causa das suas lágrimas.
____ Sim...
____ Então tome a minha vida... ____ Derrepente Miguel agarrou os meus braços,ao mesmo tempo, pela parte de baixo, empurrando a faca contra sua pele, sua outra mão firmimente segurou nela na parte mais afiada,que no mesmo instante pingou sangue, forçando ela contra sua pele... querendo me transformar em sua assassina.Afundando a faca larga e super afiada um pouco abaixo do seu peito, a sua pegada era firme nos meus dois braços,faziam esforço,puxando as minhas mãos na sua frente, para que a faca penetrasse na sua pele...e eu ao contrário tentava em vão puxa-la de volta...mas ele não permitia,sua mão grande agora apertava os meus pulsos enfaixados,mas não conseguia sentir as feridas,pela adrenalina. Me desesperei completamente.
Tentando puxar de volta...das suas mãos que pingavam grossas gotas de sangue no chão. A faca afiada cortando a sua carne ao meio. Ele não mostrava dor ao ser cortado, não a dor física.
____ Mata-me. Vamos. Me mate!!! ____ Gritou enfurecido,dominado por algo desconhecido.____ Vamos. tenha a sua vingança, Rafaela. Mata-me!!!
_____ Para... Miguel...solte... ____ Minha força era inútil,esforçava para arrancar a faca que ele fazia questão de forçar contra ele, através das minhas mãos a mata-lo. Seu rosto contorcido pelo sofrimento e pela tristeza, mexiam de um jeito lá no fundo do meu ser.
_____ Se vinge Rafaela!Se eu não posso mais ti ter é melhor estar morto...seu sangue pelo meu sangue...____ Lamentou ele choroso.
____ Miguel... ___ Eu olhava para ele cheia de pena, remorso e rancor. Sem coragem para seguir em frente, falhando ao puxar a faca de volta e com ele fazendo de tudo para fura-lo ainda mais,a ponta do metal gelado perfurou a sua pele por cima do tecido, manchando na hora sua blusa azul de sangue,a que usou no casamento dos nossos amigos. Parecia não se importar com mais nada,a sua vida entregue nas minhas mãos. Sangue nas mãos... sangue...esse sangue todo...___ Olhando para ele,sua mão escorregou mais para sua frente, até consegui me soltar do seu aperto mortal, soltei a faca, trêmula e perdida, Miguel, continuou na mesma posição, agarrado a ela,como uma âncora da salvação. Largei tudo, saindo correndo, deixando ele para trás.
Corri para casa feito uma louca, esbarrando em algumas pessoas no caminho. Exugando o rosto que estava banhando de lágrimas.
Eu me acorvadei,mas matar uma pessoa era mais difícil do que imaginava.
Derramei o seu sangue. Sangue por sangue. Teria que me contentar que o feri. Miguel tinha aceitado a sua morte, e eu era o seu executor,o seu carrasco. Ele também era um covarde. Querer morrer para se livrar do sofrimento de ter me machucado? Nenhuma dor pode ser comparado a minha.
Na minha casa eu corri para a cama,me abraçando e chorando.
Miguel merecia morrer. Então porque raios...eu não o fiz.
Me odiei por não ter tido a coragem suficiente para prosseguir.
Estava no inferno que ele mesmo nos jogou.
Seria sempre assim?...essas sensações de infelicidade,mergulhada nesse mar de desolação?
A vida perdeu todo o sentindo, não há cura para os meus males. O desejo de vê-lo morto foi aos poucos se dissipando ao constatar que ele sofria arrenpedido, chorando na mesma complicencia, partilhando a mesma causa do martilio.
Miguel me ofereceu o alívio de acabar logo com essa situação que ele nos envolveu.
Mas será que eu me sentiria aliviada?
Ou seria cada vez pior viver na tristeza de ter cometido um assassinato.
Aos poucos o choro e as tremedeiras foram sedendo. E no seu lugar uma sensação de solidão.