Fernanda narrando
Mostrei pra ele o que é pilotar, a mãe tem as manhas, aprendi com meu pai e minha mãe odiava isso, ela morria de medo de eu me machucar sério, já levei uns tombos claro, mas são só história pra contar, hoje eu sou o toque, amo a adrenalina que a moto me traz, principalmente quando estávamos no sítio de um amigo dele e pilotávamos feito loucos, já que eu era menor de idade e não poderia pilotar sozinha
Quando eu fiz 18 anos ele me deu uma cbr igual a dele, até a cor era igual, eu era fissurada naquela moto, mas quando eles morreram eu vendi a moto, eu não suportava mais sequer olhar pra ela, eu tinha 19 anos quando eles morreram e eu simplesmente surtei, morava praticamente dentro do batalhão, tinha pavor de voltar pra casa e não ter eles lá, aquele silêncio, aquele vazio que eles me deixaram, me dói tanto até hoje
Quando eu decidi comprar uma moto nova eu pilotava chorando, e eu jurei pra mim que seria bem diferente da que eu tinha com meu pai, foi desafiador voltar a pilotar, sempre que estou pilotando eu vejo o sorriso do meu pai na minha memória é isso me encanta de uma forma avassaladora, como eu queria que fosse tudo um pesadelo
Confesso que pilotar a moto do temido Th foi uma adrenalina absurda, ainda ousei em dar uns graus, coisa que minha mãe odiava e eu só ouvia os gritos dela na minha cabeça
Ela tinha um jeito durona e moleca por conta da profissão, mas ela odiava que eu fosse igual, ela queria que eu fosse uma dama, princesinha, mas eu sou uma hora que odeia firula, eu empinava mesmo, odiava usar vestido porque me atrapalhava, mas agora que eu domino eu vou com a roupa que for, essa adrenalina é minha vida
Eu me diverti com a cara de todos espantados comigo e eu queria gargalhar mas tive que manter a conduta né, sai linda na direção do meu carro e fui pro apartamento que o bope me disponibilizou aqui em são Conrado, o que eu era contra, queria algo mais simples e rodei muito até achar um bem simples mas aqui é zona sul né então não tem como ser nada tão simples, mas confesso que dei meu máximo, até porque eu vou ter até um trabalho de fachada, se eu falar que vivo de herança eles vão pesquisar quem são meus pais então tenho que falar uma mentira, falar que me separei e a única coisa que eu fiquei foi esse apartamento é uma parte do negócio dele, foi isso que ajustamos no bope mas não sei se vai dar bom, mas eu sou boa de improviso
Entro no apartamento é está tudo do jeito que eu gosto, simples e nada de muitos móveis, essa vai ser a minha casa durante tempo indeterminado, tiro meu salto e jogo ao lado da porta, tomo um susto quando acendo a luz e vejo Henrique sentado no sofá
- já está quase de manhã Fernanda - ele fala se levantando e vindo na minha direção - você está fedendo a droga - ele fala me reparando
- primeiro o que faz aqui dentro ?- eu falo seria encarando seu rosto
- trouxe as malas que você pediu para deixar aqui - ele fala firme
- era deixar as malas e vazar, Henrique - falo brava - você sabe que eu poderia chegar com ele né imagina dar de cara com você - falo brava só de imaginar a possibilidade
- ele não vai entrar nesse apartamento com você - Henrique fala entredentes quase rosnando
- você não sabe disso Henrique e não tem nada a ver com essa situação- falo brava encarando ele que vira de costas pra mim respirando fundo
- você já está se enfiando dentro de uma favela, circulando no meio de um monte de favelado e eu não posso ficar preocupado?- ele fala irritado vindo pra cima de mim
- Henrique nossa conversa é apenas no batalhão - falo indo pra porta - vai embora Henrique - abro a porta e ele me encara desacreditado- eu não tenho nada com você entende isso de uma vez por todas e eu estou em uma investigação - relembro ele - agora some daqui eu não estou brincando - falo e dou um soco na porta com força
- eu vou mas a nossa conversa não termina aqui Fernanda - ele fala sabendo que eu odeio isso
- tenente munhoz pra você - exclamo no corredor - eu nunca te dei liberdade para tanto - falo e entro de volta no apartamento fechando a porta com força
Cara babaca, eu sou tão treinada quanto ele, eu entro e saio da favela da mesma forma que ele, essa psicose dele me irrita de uma forma inexplicável
Vou pro quarto e vejo as malas todas no canto, arrumo tudo no lugar de uma vez e coloco as malas em cima do armário, pego uma camisa do meu pai que eu amo dormir e uma calcinha, tomo um banho e relembro da sensação de descer a favela empinando a moto, foi libertador demais, eu confesso que amei a adrenalina correndo nas minhas veias
Amanhã tem o tal paredão, e eu vou dar um jeito de me infiltrar lá, acho que vou falar que vou vender esse apartamento com a desculpa do meu ex perder total contato comigo e quero alugar uma casa por lá, pra isso eu tenho que me aproximar ainda mais da Nathalia, eu gostei dela, mas isso tudo não se passa de uma missão
Saio do banho enrolada na toalha, vou para o quarto passo um creme no corpo, tiro a toalha do cabelo e passo um creme também, já até amanheceu, coloco uma camisa do meu pai que eu adorava e vou secar meu cabelo, quando deito na cama tem diversas mensagens do Henrique
- eu não sou nenhum cachorro, estou preocupado com a sua situação, não tinha necessidade de você me expulsar daí
E várias outras que eu nem perdi tempo lendo, só virei pro lado e apaguei, eu em cara quer pagar de doido, duvidando da minha capacidade de fazer o que fui treinada pra fazer
Acordo com meu celular apitando mensagens e olho vendo que são mensagens da Nathalia
- e aí gata vai brotar ? Tô sabendo que gosta de dar grau já em kkkkk os meninos fazem evento de grau também quando tem paredão - dizia a mensagem dela
Quando eu ouvi isso coração chegou até a acelerar, eu já iria óbvio, mas agora vou até de moto também pra poder tirar uma onda e entrar no evento deles
- será que deixam eu passar com a moto de boa ? - respondo ela
Eu sei que o Th já falou que poderia mas eu dou uma de doida né, tenho que me aliar a essa menina, vai ser ponto alto na minha missão lá dentro
- claro né o patrão já liberou é só dar um salve quando tiver na barreira que eu desço pra te buscar - ela manda e conversamos um pouco assuntos superficiais
Levanto da cama e tomo outro banho como de costume, faço minha skin care e arrumo a cama, vou na cozinha e vejo as coisas do armário estão abastecidos já pro meu alívio, faço dois ovos mexidos com pão francês e um café que não pode faltar e mando pra dentro, lavo a louça e vou me arrumar pro evento
Como acabei de tomar banho já vou direto escolher minha roupa, pego um short saia jeans e um corselete branco, coloco um Nike preto com branco nos pés, meus acessórios, passo meu perfume e estou pronta, desço e vejo que até minha moto já está aqui como eu pedi, subo nela e como sempre vejo o sorriso do meu pai na minha frente
Acelero na direção do morro que é bem pertinho a subida pro meu alívio, já que fica no mesmo bairro, mas o ap é mais no que se denomina a área nobre, mas é bem próximo a subida do morro, coisa de uns cinco minutos tô no pé do morro
Quando chego na barreira os meninos já me olham de cima a baixo e eu tiro o capacete
- tá indo onde dona ?- um dos moleques perguntam
- tô indo no paredão Th liberou minha entrada - falo seria e eles dão sorrisinho
Como eu já tinha avisado a Nathalia que eu estava chegando, logo aparece uma moto grande e ela sem capacete
- bora gata - ela me chama virando a moto - tá comigo em convite do patrão - ela fala e os vapor libera a minha passagem
Subimos e a Nathalia pilota muito também, ligo o pisca alerta igual a ela e vamos subindo o morro, uma coisa não posso negar, esse morro é cheio de vida e cores, nós sabemos que em morro não tem só bandido, tem muita gente de bem, e é por eles que lutamos, somos sempre recebidos a tiros e retribuímos, mas o bope e assim, somos treinados pra matar, a realidade nua e crua é essa, óbvio que eles colocam de uma forma fantasiosa, mas nós sabemos a realidade do que eles querem é matar esses vagabundos
Chegamos na rua do paredão e já tem vários carros de som tocando música alta, e se ontem eu achei que as meninas estavam quase nuas, hoje elas estão completamente
- para tua moto aqui - Nathalia fala e eu encosto do lado dela - motao em cara tu faz o que da vida ?- ela pergunta logo de cara
- então eu tinha uma empresa com o meu ex marido mas quando separamos eu fiquei com esse ap de são Conrado e vendi minha parte da empresa pra ele - falo e ela concorda andando com a chave da moto no pescoço e eu coloco a minha no bolso
Eu não trouxe nem bolsa, dinheiro tá na capa do celular e hoje em dia todos aceitam pix, até conta bancária com a identidade falsa eu tenho, o meu nome continuou o mesmo o que mudou foi todo o restante, inclusive e principalmente meu sobrenome
- não quer mais nenhum contato mesmo com ele em - ela fala e eu concordo
- quando acaba realmente acaba pra mim - falo e ela concorda
- tu é das minhas - ela fala rindo e entramos na rua com os seguranças dela
Somos rodeadas de todos os lados, nos aproximamos de uma mesa com vários caras armados, entre eles o marido da Nathalia, só não vi o tal Th
- teu homem tá chegando - o marido da Nathalia fala
- esse é o jovem meu marido é essa tu já sabe quem é- Nathalia fala simples
- Fernanda - falo esticando a mão pra ele que faz o toque comigo
- bebe ?- ela pergunta e eu n**o - oxi nada ?- ela pergunta e eu vejo uma latinha de energético
- só um energético mesmo vou pegar ali no bar - falo e o marido dela n**a
- pega daqui pô tá suave - ele fala e eu agradeço e pego
Observo o movimento e tem muita gente mesmo, até mesmo famílias nos bares almoçando e tudo mais, começa a tocar um grupo de pagode e o pessoal se anima
Estava dançando com a Nathalia quando sinto uma presença atrás de mim e viro me deparando com o Th
- tu veio de moto e com essa saia ?- ele fala de cara e eu me espanto
- boa tarde pra você também - falo e volto a dançar com a Nathalia
- eita que o patrão ficou interessado - Nathalia fala rindo e eu n**o
- e eu estou correndo - falo e ela começa a gargalhar
Olho e o Th está sentado do lado do tal jovem, os dois chefões do tráfico na minha frente e eu tenho que fazer cena, minha vontade é descer a mão na cara deles e levar tudo preso, vejo ele me reparando de lado mas não esboça nada
Quando olho pra frente de novo vejo a loira chegando e vindo na direção da mesa sentando no colo dele e eu nem ligo
- oi linda tá sozinha ?- um homem com uma fuzil e cheio de ouro para do meu lado
- tá não - ouço a voz grossa do Th - é minha convidada - ele fala e eu olho seria pra ele
- então eu agradeço o convite mas me retiro - falo e dou as costas pegando a chave da moto no bolso
- um racha eu e tu bora - Th levanta e para na minha frente - vi que tua moto é igual a minha né - ele fala e eu me pergunto como ele sabe
- tá afim de comer poeira ?- falo desafiando ele é de repente todos os aliados se levantaram e o Th me encara com um sorriso de lado
- comer poeira no meu morro paty ?- ele fala rindo e eu encaro ele rindo também