Iludida

1561 Words
Fim de semana a vista, chuva mantinha-se, o céu parecia enraivecido com algo, estava deitado na cama tinha a cortina aberta para olhar a paisagem, mantinha um nervo a dificultar o meu pensamento. Mesmo depois de, ver o quanto tudo estava bem, não me conseguia libertar do pensamento de tragédia. Levanto com o estômago a doer, a fome começava a apertar. Aqueço um pouco de leite e como com cereais, fico novamente pasmada a olhar para o céu. Não tenho planos para o fim de semana, para além do estudo constante e um trabalho que tenho de apenas finalizar a formatação e enviar no grupo de trabalho. Ia ser um dia maçador. Sete-Sóis dormia na minha cama enrolado, passara lá toda a noite, estava feliz pela ligação. Recebo uma mensagem no insta. Clara-boia Vai ver as novas nas histórias da Magali… amor está no ar. Okay!!? Entre na página da moça e clico nas histórias, no mesmo banco da foto anterior estão os dois novamente na chuva, desta vez com uma foto tirada por eles. Parecem ambos felizes, noto o fundo verde, apenas do lado esquerdo se vê um pequeno vulto escuro. Amplio a foto, desfoca, estranho e o meu nervo aparece. — Na verdade, é a coisa mais normal, pessoas no fundo, de fotos… - Falo alto para mim mesma. Sete-sóis acorda e mia alto, devia ter fome, pois correu até mim e roçou-se nas minhas calças de pijama e logo parou em frente e taça da ração. Guloso e fofinho como sempre. Coloco a louça na pia, não tinha vontade de lavar. É apenas uma tigela. O telemóvel começa a tocar, we all lie toca pela casa. Gael aparece no ecrã, o que será o problema no momento. — Bom dia e qual o problema, meu senhor? – Falo exagerando na felicidade. — Por que haveria de ter um problema? – Voz rouca e acabada. — Primeiro semestre ainda não findou e já te ajudei em dois problemas. — Ambos com motivo, não foi? — Nem por isso Gael, apenas diz o que precisas! – Sabia que não vinha coisa boa. — Então estou no Porto, na casa de uma colega e os comboios estão de greve, coisa que não sabia com antecedência, tenho de voltar hoje a casa para a festa de anos da minha mãe…. —Colega? —Tens sexto sentido, Clara? – Gael fala remordendo. — Não, mas sei que tens aí amigos, não colegas, chama-se prestar atenção, sabes! Queres que te vá buscar certo… — Se não fosse muito, perdi a minha carteira... —Gael, diz-me que não foste para aí ontem para dormir com alguém que conheceste ‘online’. – Já devia ter adivinhado a calma dele. — Podias ser advinha. – Dá umas gargalhadas. — Podias ir preso, sabes que não podes andar sem documento de identificação, queria ver a polícia pedir o teu cartão de cidadão. – Começava a ficar chateada. — Nem tudo é mau, ela é uma beleza, louca, mas muito boa Clara. — Louca? — Então, basicamente estou na rua com as minhas calças na mão e o meu telemóvel, ela ficou chateada por ter dormido com a irmã. —Irmã? Gael será que podes expandir a história… - Já via o enredo do que se tinha passado. — Será que podia fazer isso no teu carro com ar condicionado quente e café, está realmente frio aqui. – Ri-se de forma baixa e fraca. – Vou mandar a morada ok. —Tá. Quem diria, já tenho planos para o sábado. Quanto as duas vezes… então o desgraçado dormiu com uma destravada em Aveiro que o abandonou a meio da noite e tive de o ir buscar a Barra quase nu, pois alguém roubou a roupa dele do areal, na segunda deu-lhe para festejar o Halloween em demasia e ligou-me as 5 da manhã, pois tinha os seguranças da boate atrás dele após ser apanhado a comer uma rapariga junto ao bar. É minha gente, sexo ao vivo, para que ver porno, o álcool era algo que trazia o mais proibido e divertido no Gael. Apenas espero que tenha as cuecas vestidas, não quero buscá-lo nu novamente nem fugir a nenhuma forma de autoridade. Os seguranças seguiram-me em Aveiro por 20 minutos, de cada vez que conseguia desviá-los o Gael sempre berrava bêbedo. Foi a pior madrugada da minha vida, pior ainda foi transportá-lo bêbedo para o carro e correr com ele por vielas a tropeçar em tudo. No final ainda o tive de obrigar a vestir as calças, pois andava com as cuecas à mostra pela cidade. Dou umas festas em Sete-sóis e visto-me rapidamente, lá ia eu para o Porto, como odiava o trânsito lá. Lento e catastrófico, Lisboa não ficava muito atrás, mas sempre era mais calma de se andar, os nortenhos não brincam a conduzir. A chuva não ajudava e para piorar a rapariga morava no meio do Porto, subidas e descidas sob paralelo e muito trânsito. O segundo inferno da minha vida, a música do rádio ia ajudando, chego finalmente na rua que ele mandou e olho em volta. Não o vejo, ando devagar e olho bem para os passeios, quando dou conta já outra rua começa, não há nada a fazer, tenho de telefonar. Toca nem 5 segundos. — ESTOU ATRÁS DE TI, NÃO ANDES MAIS… —SEU IDIOT*, FILHO DA PUT*, VOLTA AQUI!!!! Chamada caí e olho para a traseira do carro pelo espelho exterior. Gael corria com as calças na mão, cuecas vestidas pelo bem do senhor e uma rapariga loira corria de pijama púrpura atrás dele. Chega ao carro e abre a porta rapidamente. —Arranca, VAI!!! Arranco logo e ouço algo no fundo do carro. — O que foi aquilo? — Então acho que a irmã era virgem. – Coça levemente a cabeça e ri. – Nem notei que ela tem…. — Eu estou a falar do barulho na traseira do meu carro Gael. – Tento controlar a minha voz. — Ah, foi o chinelo dela… - Põe o cinto e vira-se para o vidro. – Louca. Eu realmente não apanho nada normal… Eu queria esganá-lo de tanto ódio, mas apenas segui rota para o café mais próximo e pedi-lhe para vestir as calças, saí para buscar café e voltei para dentro do carro. — Tens o café e já estás quente, explica esta merda, pois o meu carro levou com um chinelo de alguém com quem não fod*. – A minha fala passiva agressiva não matava ninguém, mas naquele momento podia cometer homicídio por conta daquele chinelo. — Eu comi a irmã de alguém que comi a três meses... e aparentemente ela era virgem então a mais velha… — Então tu comeste a irmã de alguém com quem andaste envolvido no passado. – Interrompi. — Não envolvido, foi apenas uma noite, mas aparentemente ela lembra-se bem da minha cara. – Fala não fazendo caso. — Deixa então ver, tu dormiste com ela, provavelmente foste embora no primeiro comboio da manhã e achas que ela não tem motivo para tanta exaltação. — Nem tudo que falaste, eu ficaria assim se visse alguém sair do quarto da minha irmã, só não lhe batia com o chinelo. Olho para ele sem saber como responder com respeito. — Talvez numa próxima... devas olhar as fotos em volta da casa e talvez… - Aumento a voz. – Ver se a casa te parece familiar Gael!!! — Não volta a acontecer, juro. — Quero ver isso, tens de parar de iludir as mulheres, sabes melhor que ninguém o quão louca pode ficar uma mulher com este tipo de coisas, mulherengo… vamos embora, mas é. — Vamos, desculpa. – Aperta novamente o cinto. — Não tens aniversário nenhum, pois não!? —Não. Gael olha para mim com medo. Podia esfolá-lo de raiva, respiro fundo e controlo a raiva interior, logo estaria em casa e descansaria, finalizava o meu trabalho e estudava um pouco, iria ver a minha série e dormitar com Sete-Sóis. O domingo foi definitivamente bom, o bichano está cada vez mais comunicativo e finalmente o vi comer comigo do lado, estudei matemática toda a manhã e à tarde fiquei a ler no meu canto. No final apenas olhei a chuva caindo, uma semana tinha passado desde a insónia, o meu sono não melhorou. Tinha a sensação de solidão como de costume, algo que não conseguia ligar, uma peça que ainda me fazia confusão sempre que aquele ciclo se notava. Talvez fosse apenas o meu medo, tudo estava perfeito, menos Gael, mas ele sempre tinha momentos destes, viver ao máximo, nadar nu, comer nu, até mesmo ler, não descobri da melhor maneira. Resumindo liberdade de expressão era algo que ele praticava diariamente. Telefona toca. — Se for ele novamente vou realmente esganá-lo… - Levanto-me e olho a tela. Magali —Sim. —Oi, Clara. —Olá, tudo bem? — Sim, preciso de ajuda em algo…. – Para de falar por instantes, ouço uma porta fechar. —Porque estás a susurrar? —Então… — Precisas que te busque também? – Interrompo antes de ouvir algo que não quero. — Sim! – A voz estava abafada. — Não dormiste com o irmão dele, pois não? — Não, mas ele namora ainda aparentemente… estou debaixo da cama. O meu fim de semana não podia ser mais calmo.
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