PRÓLOGO

2485 Words
ROMEO Eu era bem jovem quando me apaixonei. Me apaixonei de verdade. Alguns hoje em dia subestimam essa palavra, paixão, amor. Se apaixonam aos doze, novamente aos quinze, outra vez aos dezessete, para continuar se "apaixonando" mais e mais vezes. "Ela não é a única garota do mundo", "A fila anda", "Você ainda vai conhecer muitas pessoas" – Essas são as frases que outros nos dizem ao longo da vida. Mas entenda, se ela não é a única garota do mundo, se a fila andou, se você ainda espera e quer conhecer outras pessoas, é porque você não a ama. Quando se ama alguém não existe mais ninguém no mundo, além dela. Você não vai conseguir deixa-la para trás e seguir em frente, você não deseja conhecer mais ninguém porque sua vida inteira é aquela pessoa. Isso não quer dizer que você nunca mais vai f***r alguém, que não vai precisar saciar o desejo numa trepada carnal e deliciosa. Mas depois de tocar a pessoa que você ama, depois de um verdadeiro amor, você entende que nunca mais vai poder passar disso. Está destinado a um prazer vazio o resto da vida, e até isso te deixa... Furioso. O amor pode dar a vida e ao mesmo tempo lança-lo ao abismo em questão de segundos. É pelo amor que vivemos ou morremos, sem ele a vida perde o sentido. Eu perdi o sentido da minha – no momento em que eu a perdi. Uma vida sem amor não é vida, é sobrevivência. Eu sobrevivi, continuo sobrevivendo todos os dias carregando um peso enorme. O peso do meu pecado. De algo que eu dediquei minha vida a procurar a morte para conseguir aquietar minha consciência. Ela me perdoou. Ela me disse que sim, que estava tudo bem. Mas e eu? Poderei me perdoar algum dia? Eu quero me perdoar? Nunca vou esquecer o dia em que eu a vi pela primeira vez. Os olhos inocentes e cativantes, os cabelos escuros balançando enquanto ela caminhava pelo jardim até mim para pedir informação, o sorriso doce e o cheiro de flores. Ela era a pureza e a bondade do mundo, a minha bondade. Sem ela restou apenas a escuridão. Flashback on ~ — Olá. — Meus olhos param no sorriso mais delicado que já vi. Já vi muitas garotas mas nenhuma delas fez meu coração parar e minha voz falhar. — Eu acabei de chegar, pode por favor me ajudar a me encontrar aqui? Esse lugar é enorme e você estava sozinho, decidi pedir ajuda. Oi? Está tudo bem? — Sim, perdão. — Fico de pé ajeitando meu casaco disfarçadamente. — Eu estava distraído. O que disse? — Pode me ajudar? Sou nova aqui e não sei para onde ir. — Como alguém pode ser assim? Ela está usando roupas confortáveis e fofas, calça e moletom, mesmo assim parece ter saído do céu. — Claro, tudo que você precisar. — Lanço um sorriso para ela, vendo suas bochechas ganharem cor. — A propósito, sou o Romeo. — Seu nome é mesmo Romeo? — Posso jurar que os olhos dela ganharam um brilho maior quando confirmo com a cabeça. Olho para sua mão pequena estendida e logo seguro dentro da minha. — Sou a Julieta. — Está brincando, não é? — Meus olhos crescem. — Estou, infelizmente estou. — Sorri. Flashback off ~ — Sr. Lorenzo! — Ouço o chamado de Vittorio me tirar das minhas malditas lembranças que não me abandonam. — Aqui está, precisa cuidar disso o mais rápido possível. O Sr. Rossi está fora de controle. — Eu disse que cuidaria. — Afirmo arrancando o envelope das mãos dele. Vittorio é um puxa saco do Rossi e por isso tende a ser tão dedicado. — Não gosto que duvidem de mim. — Sim senhor, com certeza ele não duvida de você. — Eu o encaro e o vejo diminuir em minha frente. — Então por quê o pânico? — Ganho o silêncio como resposta. — Foi o que eu pensei. Avise ao Rossi que pode recuperar o seu controle. Guardo o envelope no bolso e caminho para fora. Não é um dia atípico, na verdade é algo bem comum. Algumas parcelas de um pagamento grande estão atrasadas e isso já está incomodando o Rossi, precisamos mostrar quem manda e o que acontece com quem esquece isso. Trato é trato. Se você deu sua palavra, cumpra. Na irmandade, deixar de cumprir com sua palavra é o pior crime. Para um acordo ser quebrado, isso é feito com sangue. E eu sou o homem certo para lembrar isso a qualquer um. Faz cinco anos desde que deixei Seattle, decidi ter a Itália como meu destino. Nasci e cresci no estado de Washington mas meus pais são italianos, eles foram embora daqui quando minha mãe ainda estava grávida. Cresci ouvindo histórias sobre a época em que eles moravam aqui e foi para cá que decidi vir quando... Quando tudo aconteceu. Foi quando eu conheci o Rossi, não precisou mais que alguns meses para eu me tornar seu braço direito – O que venho sendo há anos. Rossi confia em mim e estar na irmandade é como minha punição para os meus pecados, mesmo que aqui eu cometa vários outros – há apenas um que não posso me perdoar. Aqui é o meu inferno. Mantenho distância da minha família para protege-los. Eu não posso arriscar voltar e coloca-los em perigo por mais falta que façam. Eu não sou mais o mesmo homem. Quando aconteceu toda a merda da minha vida, minha mãe tentou me levar a um psicólogo ou psiquiatra. Mas era tarde demais para salvação. Eu não queria me curar, eu queria morrer. Eu quero a morte, eu a venero. Fui bem treinado após chegar na irmandade. Sempre fui alto e tive um ótimo porte físico, mas sempre dá para melhorar. Com o treinamento intensivo que recebi durante uns anos e a malhação que realizo todos os dias, meu corpo virou uma máquina. Com minha altura e meu "novo" corpo, eu me tornei um pesadelo para quem ficar no meu caminho. Também deixei meu cabelo crescer até os ombros assim como minha barba se encheu. Os cabelos longos e barba crescida me ajudam na imagem amedrontadora que preciso, além de me tornar quase irreconhecível. Mudei meu nome caso alguém tentasse me encontrar. Romeo ficou para trás, assim como quem ele era. Com o nome Lorenzo, a transformação física e os recursos da irmandade, tornou-se impossível alguém me encontrar. Passo direto pelos corredores da casa de Rossi, uma delas na verdade. Essa não é a verdadeira casa dele, mas é uma enorme mansão que é usada como sede da irmandade. Tudo acontece aqui – Porém mais ninguém sabe disso além dos membros. Nem os membros da máfia rival ou policiais podem descobrir esse lugar, por isso sempre que temos reuniões com parceiros ou outras reuniões importantes com convidados não usamos a sede e sim outros lugares. Hoje é dia de contagem, o galpão no subsolo é usado para o armazenamento do material e agora devem estar sendo separados, contados e registrados no computador até a entrega que acontece na madrugada. As vezes eu supervisiono as entregas, mas apenas se for algo grande. Nas salas cada um cuida da sua parte dos negócios, que sinceramente não me interessa. Apenas faço o que tem que ser feito e pronto, cada um cuida do seu. Sou o homem da ação, da limpeza. Quando tem algum problema para resolver, algum "rato" escondido entre nós ou alguém que precisa ser colocado em seu lugar, eu sou o homem para isso. Arranco com minha moto até o galpão escondido do Cartier. No envelope estava o endereço, mas nem precisei abrir, já sei exatamente onde é. Disse que iria cuidar do assunto e estava cuidando, com um pouco de pesquisa e alguns favores que me deviam encontrei o lugar. Em frente ao galpão, desço da moto e confiro minha arma escondida no coldre preso na minha calça, carregada como sempre – A única amiga que tenho desde que cheguei na Itália. Rossi? Não, Rossi não é amigo de ninguém. Ele é dono de uma máfia poderosa, cheio de recursos e de grana, eu sou valioso para ele e por isso cuido dos assuntos dele. Mas sou apenas isso, um erro meu e eu me torno mais um corpo em sua lista. Cartier é um dos nossos clientes, o homem tem uma empresa de fachada mas faz contrabando de armas desde antes de eu ser da máfia. Ele já deveria entender que não se engana a irmandade. Já vim com tudo que preciso fazer ensaiado na minha cabeça. Assim que entrei as armas se apontaram para mim, umas oito ou dez se contar os que estão escondidos. Não esperava menos, é o ritual quando se entra no meio de um galpão envolvido com a máfia. Apenas permaneço firme encarando-os, posso afirmar que as mãos deles tremem agora mas eles continuam porque acham que estão na vantagem – só acham. Todos estão pensando "Somos dez, ele não sabe dos outros dois escondidos atrás da parede de gesso, ele é apenas um!". Mas aí está o erro. Primeiro que eu notei as sombras dos dois amadores escondidos desde que entrei, assim como o barulho de suas armas batendo levemente na parede fina e oca. Segundo, eu entrei aqui sabendo que armas seriam apontadas para mim, eu sabia exatamente o que me esperava. Mas eles, sabem o que eu vou fazer? Sorrio lateral. — Vocês tem cinco segundos para abaixarem as armas e trazerem o filho da p**a Cartier para mim. — Solto sério. — Já não estou feliz em ter que vir aqui, não me façam perder mais tempo. — Você marcou hora? — Diz o que aparenta ser mais velho, na faixa de seus quarenta e que eu já conheço de vista. Acredito que seja o homem de confiança do Cartier. — Eu não preciso. E o tempo acabou. Saiam da minha frente antes que se machuquem, crianças. — Começo a caminhar, eles destravam as armas mas dão alguns passos para trás quando continuo seguindo em frente na direção deles. — É do interesse dele. Quatro estavam jogando dominó em cima de uma mesa improvisada e levantaram assim que me viram, os outros quatro já deviam estar de vigia. Sem mais paciência, levanto a mão e abro revelando o detonador das bombas que mandei instalarem aqui na madrugada de ontem. Não estavam ativas mas aperto o botão de ligar e o barulho da ativação é suficiente para fazê-los perder o nariz em pé. — p***a, Lorenzo! — Ouço. — Agora tragam o chefe aqui. Deixa eu ver, vocês tem... — Olho o cronômetro no detonador. Claro que não vou me explodir junto, mas eles não sabem disso. Eu tenho a fama de ser meio louco, então não duvidam que eu seja capaz de fazer alguma coisa. Dei meia hora para as bombas explodirem depois de acionadas. Todos me olham confusos, esperando algum receio vindo de mim, mas não notam nada além de certeza. — Cinco, quatro, três, dois... — Tá bom, c*****o! — O grito de desespero me faz sorrir, aperto um botão que desativa temporariamente a contagem, mas ainda deixa as bombas ativas - é o meu trunfo até sair daqui - e guardo o detonador na jaqueta. Todos abaixam as armas e logo o seu homem de confiança vem trazendo Cartier até mim. Nenhum dos dois aparentam estar felizes, o que não faz nenhuma diferença para mim, ou melhor, me deixa feliz. Assim que se aproximam de mim, com um movimento só uma mão prende a nuca de Cartier e com a outra saco a arma com maestria e direciono na cabeça dele. Todos se desesperam novamente e tornam a me apontar suas armas. — O que está fazendo, Lorenzo? Por que invadiu esse lugar? Abaixe essa arma e vamos conversar. — Tenta Cartier. — O tempo da conversa acabou. Onde está o dinheiro? — Eu não tenho. — Mente. — Me solte, vamos fazer um acordo. — Se vierem atrás de mim, eu estouro a cabeça dele. — Aviso. — Dê a ordem. — Está tudo bem, rapazes. Podem relaxar, nada vai acontecer. — Sinto o corpo trêmulo dele começar a suar. Saio arrastando Cartier comigo pela entrada principal do galpão e enquanto aponto a arma para ele ordeno que feche a porta, trancando seus capangas junto com as bombas lá dentro. Só precisei de cinco minutos a sós com ele, para o velho Cartier transferir o dinheiro em forma de Bitcoin para o Rossi. Só então subo de volta na moto após libera-lo – com alguns hematomas mas inteiro – e desativar as bomba. No caminho de volta recebo uma ligação do Rossi a atendo pelo fone de ouvido enquanto dirijo até minha casa, um apartamento no centro da cidade – Roma. Ligação on ~ — Recebeu meu presente? — Atendo. — Meu garoto! — Comemora. — O que posso fazer por você? — Vai precisar de mim hoje ainda? — Não tenho mais nada, por enquanto. Você pode ir. — Ótimo. — Já imaginava. — Preciso de companhia para a noite. Como eu disse não tenho nem desejo de conhecer alguém, trabalhar para conquista-la e só então leva-la para a cama. Esse ônibus já zarpou. Só preciso aliviar o estresse e comer alguma b****a para saciar minha fome, mas não preciso conhecer ninguém, fazer a fila andar ou alguém para amar. Eu amei. Uma única vez. E o nome dela era Lara. — Pode deixar. — Concorda me afastando novamente dos meus pensamentos e desligo. Ligação off ~ Chegando no prédio, guardo a moto e subo até a cobertura onde moro. Costumo não chamar muito a atenção dos vizinhos e tento passar despercebido, o que é difícil com o meu físico – Mesmo assim, sou conhecido por ser antissocial, então não me enchem o saco. Mal abro a porta de casa e ouço o barulho da chamada vindo do computador. Tranco a porta atrás de mim, retiro a arma do coldre preso nas costas da minha calça e vou conferir. É a minha mãe. Fazemos chamada de vídeo todos os dias, apenas meus pais tem contato comigo mesmo que não saibam onde estou. Sento em frente ao computador e o estado que encontro minha mãe faz meu coração parar pela primeira vez nesses cinco anos. Ela está com os olhos vermelhos e lágrimas descem sem parar de seus olhos, consigo ver seu desespero e seu corpo tremer daqui. Chamada de vídeo on ~ — Mãe? — Sai quase como um grito. Minha preocupação é evidente e só consigo pensar no que fizeram a ela e quem foi. — Mãe, pare de chorar e me diga quem fez isso com você. — Ninguém, filho. E...eu ... — Gagueja entre os soluços. — Aconteceu uma coisa...
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