Homem GG

1629 Words
Aquele dia, eu e Emma praticamente não nos vimos mais. Quando cheguei, ela já havia saído para o trabalho, deixando-me sozinha com meus pensamentos naquele silencioso apartamento. Exausta e desejando nada mais do que desligar minha mente, permiti-me um longo banho tentando lavar não só o corpo, mas também as tensões do dia. Depois, preparei um jantar simples e tentei dormir. Meu corpo clamava por uma boa noite de sono após quase dois dias em claro, mas minha mente não cooperava, girando incansavelmente em torno dos meus problemas, resultando em mais uma noite agitada. Já era madrugada quando ouvi a porta do apartamento se abrir. Emma havia chegado, e não estava sozinha. Entreouvi a conversa que ela teve com um homem, claramente tentando dispensá-lo. "Eu já disse que hoje não. Minha amiga não está em um bom momento e não quero incomodá-la." "Eu saio antes dela acordar. Vai, Emma, só uma rapidinha. Você me deixou louco hoje." "Já disse que não." "Poxa, gata. Eu vim até aqui só pra te trazer. Não mereço um agrado?" "Tchau, Zack." A porta se fechou com um clique suave, e o silêncio voltou a reinar. Pude ouvir os passos de Emma se afastando, silenciosos, rumo ao seu quarto. Na manhã seguinte, levantei-me relativamente cedo, apesar da falta de sono, e preparei o café da manhã para nós duas. Ela apareceu na cozinha pouco depois, ainda sonolenta e visivelmente surpresa por me encontrar acordada e ativa. - Bom dia, Emma. - Bom dia — ela bocejou, esfregando os olhos. - Como eu odeio acordar cedo. - Isso é porque você trabalha até tarde. - Eu te acordei? — Emma perguntou, preocupada. - Não, claro que não — respondi rapidamente. Não era exatamente uma mentira, já que estava praticamente acordada quando ela chegou. Emma me avaliou por um momento, antes de comentar: - Mas você ainda parece bem cansada. - Meu cansaço é mental. - Você tem alguma aluna hoje cedo? - Não. - Então por que você acordou cedo? Não vá me dizer que foi para preparar o café — ela sorriu, meio desconfiada. - E por que não? - retruquei, mantendo o tom leve. – Além disso, desde quando acordar as 9 horas é acordar cedo. - Qualquer coisa antes do meio-dia é cedo. - Emma riu. – Principalmente se você só entra as quatro da tarde no trabalho. - Gavin me deixou dobrar hoje. – Conto. - Por que você quer dobrar? – Emma pergunta, curiosa. - Preciso de dinheiro. Descobri que tenho menos do que imaginava. Eu não tive coragem de contar a Emma que minha mãe roubou meu dinheiro. Foi tão inescrupuloso que me dá vergonha. - Eu disse que posso te ajudar até você se estabelecer. – Ela insiste. - E eu disse que você já está fazendo o suficiente me recebendo aqui. Eu só preciso dobrar alguns turnos ou talvez achar outro emprego de meio período. - Fica esperta com Gavin. Quanto mais você pedir, mais ele vai se achar no direito de dar em cima de você. - Espero que não. Tudo que eu não preciso agora é mais uma dor de cabeça. - Então evite pedir favores a ele. - Não é favor, é trabalho. - Quando você recebe turnos dobrados, é quase uma cantada. Vai por mim, ele vai grudar em você igual um carrapato. - Coitado, Emma, carrapatos são criaturas nojentas. - E o Gavin não? — ela fez uma cara de nojo ao falar. – Com aquela pele cheia de espinhas e o cabelo seboso. - Ele sempre foi legal comigo e nunca pediu nada em troca. - Sorte sua então. – Ela me encara um pouco mais seria que antes - Só sei que a solução para o seu problema com dinheiro não está naquele cinema. - Eu sei disso, mas é o que eu tenho até conseguir outro trabalho. - Eu não me referia a trabalho. Kate, você precisa de um homem GG. - Homens grandes? – Arqueei uma sobrancelha, confusa. - Também - Emma gargalhou, divertindo-se com minha inocência. - De preferência aqui - afastou as mãos aproximadamente uns 30 centímetros. Corei ao compreender a que ela se referia fazendo Emma rir ainda mais. - Um homem GG é aquele gostoso e com grana. Alguém para te bancar, amiga. Esses são para casar, mas são quase tão difíceis quanto ganhar na loteria, então nos contentamos com o tipo G. - Tenho até medo de perguntar, mas o que é o tipo G para você? - Eu sabia que me arrependeria depois, mas não resisti. - Rico f**o. Enquanto eu não consigo o meu GG vou me divertindo com os gostosos que cruzam meu caminho. Tem um barman lá no clube – ela revira os olhos - quente como o inferno. - E se você acabar se apaixonando? - Nunca. Nosso caso se resume a sexø. De pobre nessa vida já basta eu. - Você não quer amar e ser amada? – pergunto curiosa. - Eu quero ser rica. O amor deixa as pessoas idiøtas, olha só sua mãe que... — ela parou no meio da frase e me olhou arrependida. -Desculpa. Eu balancei a cabeça, dispensando seu pedido de desculpas. - Seja lá o que minha mãe se tornou com Steven, não foi por amor. - Você ficaria surpresa em ver do que as pessoas são capazes por amor, – ela mantem sua posição firme. - O problema é que as vezes escutamos tanto alguém dizer que nos ama que acreditamos mais nas palavras que nas atitudes. – Dou um meio sorriso triste, pensando em quantas vezes escutei minha mãe falar “eu te amo” para mim. As coisas que ela fez, ninguém que ama de verdade faria. - É diferente Kate. - Ela insiste. - Amor é amor. - Você é muito inocente, mas, quer saber, entre nós duas, você é a que tem uma vida digna de novela, – ela dá de ombros. - Nas novelas as mocinhas sempre encontram o amor verdadeiro. Vou torcer para você encontrar o seu e que, de preferência, ele seja um GG. Eu ri das palavras de Emma. É bom ter uma conversa com minha amiga por mais malucos que sejam seus pensamentos. Após o café eu limpei a mesa e lavei os pratos, sob protestos de Emma que queria que eu descansasse um pouco antes de sair, e me arrumei para trabalhar. Como hoje eu iria direto para o cinema, já vesti parcialmente o meu uniforme, uma calça preta, sapatos pretos e uma camiseta branca. A única coisa que deixo para colocar lá é meu colete vermelho já que ele chama muito a atenção. Além dos vinte e poucos dólares que eu tinha na carteira quando sai de casa, tenho agora o p*******o pela aula de ontem. Torna minha situação menos desesperadora, mas ainda é delicada, por isso, não queria gastá-lo com almoço. Sem Emma perceber, eu preparei um par de sanduíches de presunto e queijo para levar. O cinema só abre as 13 horas, mas os que entram no primeiro turno, devem chegar as 11 horas para arrumar e limpar tudo. A pessoa que irá trabalhar comigo é a Priscilla, uma garota um pouco mais velha que eu que estudava a noite. - Você prefere as salas ou a entrada? - ela pergunta. - As salas. - Apesar do trabalho ser muito maior para quem limpa as salas, quem limpa a entrada também tem que limpar o banheiro. - Tudo bem. Amanhã invertemos. - Aparentemente, ela já sabia que eu estaria trabalhando neste turno amanhã também e se eu tiver sorte vou conseguir dobrar mais alguns dias na semana que vem. Com o cinema preparado para receber os clientes, nós duas novamente nos dividimos entre ficar na entrada ou na pequena bomboniere. Dessa vez, eu a deixei escolher indo diretamente para a bilheteria. Os poucos frequentadores que apareciam à tarde eram sempre previsíveis. Enquanto observava o hall vazio, vi um grupo de adolescentes rindo e empurrando-se na fila para comprar pipoca, claramente mais interessados em escapar das aulas do que no filme em si. Próximo a eles, um casal de meia-idade olhava os cartazes, discutindo qual filme assistir. E no canto, um senhor idoso, com seu chapéu de feltro e bengala, esperava pacientemente pelo início de sua sessão, como fazia todas as semanas. Apesar de nos proibirem de ficar com o celular na mão, algo que a maioria ignora e eu evito, hoje me vi tentada a buscar na Internet por apartamentos para alugar. Os primeiros resultados mostravam preços totalmente fora da minha atual realidade e passei a procurar por quartos. Desde que eu tivesse um lugar seguro para dormir, não me importaria em dividir o resto da casa com alguém. Infelizmente, mesmo sendo muito mais barato que um apartamento inteiro, ainda estava longe do que posso bancar no momento. Eu preciso pagar antecipadamente 3 meses, como garantia, para conseguir alugar um lugar sem fiador e considerando os gastos com alimentação e despesas como água e luz, além do aluguel em si, eu vou precisar juntar cerca de cinco mil dólares. Meu salário entre as aulas e o cinema é entre dois mil a dois mil e quinhentos. Tecnicamente eu conseguiria juntar o dinheiro necessário em pouco mais de dois meses se eu fosse uma folgada que durante todo esse período não desse um único dólar para Emma. Como este não é o caso, eu teria que ficar na casa dela no mínimo 4 meses antes de ter o dinheiro para me mudar. Por mais que ela diga que eu não incomodo, seu apartamento tem apenas um quarto. Não tem como eu ficar tanto tempo dormindo no sofá sem afetar sua rotina. Eu preciso ganhar mais dinheiro e rápido.
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