Capítulo XI

1907 Words
Eduardo viu quando Bianca correu na direção de Rafael para o abraçar. Ele se virou de costas, não suportando ver a mulher que amava nos braços do amigo. Angustiado, ele fechou os olhos e respirou fundo ao ouvir Rafael chamando-a de BB, apelido que Val havia dado a ela em algum tempo/lugar distante e inalcançável. Ele não viu quando o casal se afastou, mas de alguma forma pôde sentir a presença de Bianca esvair-se. Doía... doía abrir os olhos, sentir-se queimar por dentro com a força necessária para conter as lágrimas; doía sentir o ar gelado lhe invadir o peito, congelando o espaço onde antes sentia o coração bater; mas nada doía mais do que o vazio em que se encontrava. Eduardo levantou a cabeça, o rosto recebendo os raios do sol que não eram suficientes para aquecer o gélido vazio que tinha dentro de si. Uma mão firme tocou seu ombro, ele suspirou reconhecendo a presença de Val ao seu lado. — Eu a perdi, não foi? Eu pensei que...que era uma segunda chance, mas...— Eduardo fechou os olhos com força, tentando organizar o que o pensava e o que sentia, mas aquela dor era demais até mesmo para ele. — Por que, Val? Val respirou fundo tentando encontrar as palavras que o amigo precisava ouvir, mas nada parecia fazer sentido ou valer a pena ser dito, então ele fez o que sentia que deveria fazer, puxou Eduardo pelo ombro e o envolveu em um de seus abraços de urso. Val compreendeu o tamanho da dor de Eduardo ao senti-lo chorar em seu ombro. Eduardo era o "Casmurro" do g***o, qualquer um que não o conhecesse poderia pensar que era frio e calculista, com seu rosto inexpressivo e sorriso cínico. Chorar era algo que Eduardo raramente fazia, aliás, Eduardo raramente expressava sentimentos, e desde que a mãe ficou doente, praticamente não sorria. Val desejava que Bianca nunca tivesse se aproximado deles, que seus amigos nunca a tivessem conhecido, assim estariam unidos, sem choros ou mágoas, mas quem era ele para julgar a garota? — Vamos, Edu, vamos sair dessa m***a de praia. Acho que você precisa de pelo menos uma daquelas garrafas de tequila que compramos outro dia. ***** Val e Eduardo voltaram para a pensão em silêncio durante todo o caminho. Eduardo olhava para o lado de fora pela janela, enquanto Val tentava focar no caminho de volta para casa, ainda que seus olhos se voltassem na direção do amigo a cada suspiro ou movimento dele. Val desejava ser bom com palavras, talvez pudesse falar algo que fizesse o amigo se sentir melhor, mas para ele, palavras muitas vezes eram inúteis. Val, quando aborrecido, preferia ser deixado em silêncio em seu canto, e ele acreditava que talvez Eduardo se sentisse da mesma maneira. No entanto ele não queria julgar o amigo por si, e julgou ser melhor tentar estar do lado do amigo, e caso Eduardo se contrariasse com isso, certamente deixaria bem claro, visto que não tinha papas na língua.  Quando entraram na pensão, Val segurou Eduardo pelo ombro, impedindo-o de seguir para as escadas. — Nem pense em se esconder na tua caverna, eu falei que vamos beber as garrafas de tequila, e nós vamos! — Eduardo abriu a boca para protestar, mas Val o impediu de prosseguir. Eu sei que você quer ficar sozinho agora, mas não é saudável, você não tem que passar por nada sozinho, mano! Então nós vamos lá para cima do terraço, vamos encher a cara e ficaremos sozinhos juntos. Eduardo pensou em debater a falta de lógica nas palavras de Val, mas foi distraído pelo som de risadas e vozes masculinas vindas da escada. Ele e Val olharam na direção do som e se surpreenderam ao ver Renato e o mestre de capoeira da academia que frequentavam descendo juntos, rindo como se tivessem ouvido a melhor das piadas. Ao ver os amigos, Renato parou instantaneamente de rir, o que fez com que tanto Eduardo quanto Val franzissem o cenho ao mesmo tempo, como se tivessem coreografado a expressão. — Estávamos te esperando na praia, pensei que estivesse indo para lá...— Disse Val em tom de pergunta. — Uh... A gente tinha um trabalho da faculdade para fazer. — Respondeu Renato com a voz incerta passando a mão pelos cabelos molhados. A outra mão segurava uma toalha. — É isso aí, mas já terminamos e eu vou pra casa descansar, mais tarde tem roda de capoeira na praça dos Lagos, sabe como é...eh...você vem comigo, Renato? — Claro! Vou catar uma camisa na secadora e já vou! — Renato parou na frente dos amigos e disse: — Ele vai me dar uma carona até a autorizada onde deixei meu notebook. — Hm... Ok? — Disse Val erguendo sobrancelhas pelas informações não necessárias que tinha acabado de receber. — Beleza! Tchau, Val, tchau Eduardo! Eduardo e Val se olharam e deram de ombros em seguida. — Vai lá para o terraço, eu vou pegar o goró! ******** Val, que estava sentado em uma cadeira de praia, empurrou a garrafa de tequila vazia com o pé e o objeto foi rolando na direção de Eduardo que estava em pé próximo à amurada. — A vista do pôr do sol daqui é bonita pra c****e!— Disse Eduardo parando a garrafa com o pé e chutando-a de volta para Val, mas ela acabou rolando para longe do alcance dele. — Lembra quando meu avô pegou a gente fumando m*****a aqui em cima? — Perguntou Val rindo depois de virar mais um gole de tequila. Ele percebeu que tinha esquecido o sal e o limão, então espremeu o limão na boca com uma careta e bebeu mais um gole, pedindo perdão ao limão em voz baixa. Então se virou para o saleiro e resmungou: — Você vai ficar de fora, bem feito por ser salgado! — O senhor Bruno me deu umas cintadas no lombo que doeu para sentar por dias, e eu ainda tinha que esconder o incômodo da minha mãe ou ela iria perguntar o que houve! — Respondeu Eduardo também rindo. — Até hoje eu estou encucado com o que ele fez com o pacotinho do bagulho... — Como assim, ele jogou fora, não jogou? — Não! Fiquei com medo da minha mãe ver e fui na lixeira catar, mas o pacotinho de papel estava vazio! Eduardo se virou para Val com um sorriso cínico nos lábios, o mesmo que Val exibia. — Não acredito, mano! Seu Bruno era muito pilantra! — Disse Eduardo e os dois gargalharam. Eduardo foi até Val para pegar mais tequila e sentou ao lado dele. — Essa cadeira está furada! Minha b***a está encostando no chão! — Compra outra, ué, da última vez eu que comprei três! Só essa aqui em que estou sentado está inteira! — Com essa tua bundona, vai rasgar já já! Os dois riram e logo ficaram em silêncio mais uma vez. Assim tinham passado toda a tarde, bebendo, Val comentando eventos aleatórios na tentativa de fazer Eduardo se distrair, então silêncio outra vez. — Naquele dia Rafael chorou muito, lembra? Eu nunca o vi tão apavorado quanto quando seu Bruno apareceu aqui em cima como quem brota do nada! — E ele nem queria fumar nada, tossiu pacas e quase vomitou! — Val riu com a lembrança. — Ele era o menorzinho, né... ainda é.. Sempre fez de tudo para andar com e gente, entrava nas piores furadas, parecia até que a gente era importante e não dois desajustados sem amigos...— A voz de Eduardo não continha mais nenhum humor. — Ele disse uma vez que nós éramos os únicos amigos dele porque ninguém aceitava o fato de ele ter duas mães... m*l sabia ele que ninguém nunca me aceitou tão pouco! — Também, Val, você batia em todo mundo! — E você apanhava! — Val riu enchendo mais uma vez os copos com a segunda garrafa. — Ele era o nosso Sid, a criatura estranha, mas que fazia tudo mais legal... E agora... — Não se preocupe, Edu, Rafa não é de guardar rancor, amanhã mesmo ele nem vai lembrar. — Você não viu a cara de decepção dele, Val... Ele me olhou de um jeito... eu não queria magoar ele, Val...Eu só.. Ela é minha, Val... era minha... — Ela não é uma coisa, Edu, é uma pessoa, e ninguém é dono de ninguém! Eduardo queria se expressar melhor, dizer que ele não se referia a posse, mas a alguém que ele podia contar, que estava ao lado dele, para tudo e por tudo, alguém que fazia ele desejar ser uma pessoa melhor... alguém que fazia ele se sentir inteiro e completo... Mas apenas suspirou e virou mais um copo. De repente, sentiu muita v*****e de rir. Rir dele mesmo, da derrota, do destino, da vida! Que se dane tudo! E ele riu, e Val riu com ele....  Então o riso se tornou em soluços de choro E ele chorou, e Val chorou com ele... — É essa p***a toda que Alex falou, Val.. Jamel vu! Não.. era francês, Jameivu? — Jamé qualquer coisa com um cu no final!— Disse Val rindo da própria piada. — O destino me mostrando que eu sou um babacaidiota! Ela me chamava de babacaidiota! — E isso era amor? A mina te xingava e era amor? O seu eu do outro universo é mais estranho do que seu eu daqui! Hey, mano, quantos "eus" uma pessoa tem? — Era amor, Val...— Respondeu Eduardo ignorando a última pergunta. — Bianca sempre será o amor da minha vida! E Rafael sempre será meu irmão, Val... e eu, eu não sei o que fazer! — Hey, caras.. Hum.. será que eu posso chegar junto? Val e Eduardo se viraram na direção de Rafael e Val riu mais uma vez. — Sid! Bom te ver, estava sentindo falta da coisa grudenta! Teu olho ainda está aí? — Está sim, Val, só muito inchado! Vocês nunca vão esquecer essa coisa de Era do gelo? — Nem fodendo! Você sempre será a coisa f**a, estranha e grudenta, mano! — Val levantou cambaleando, tonto por ficar de pé pela primeira vez desde que começou a beber. Ele agarrou Rafael em um de seus abraços de urso e quase o derrubou. Então fez um gesto com a mão para que Eduardo se aproximasse, porém Eduardo olhou para Rafael esperando autorização. Rafael o olhou e hesitou um pouco, fazendo Eduardo abaixar a cabeça. Val então deu um t**a na cabeça de Rafael, que com um sorriso sem graça, balançou timidamente a cabeça para que Eduardo se aproximasse. Os três se abraçaram e um deles não controlou o choro, soluçando como uma criança. — Eu vou contar para todo mundo que você chorou, Val! — Disse Rafael sorrindo. — f**a-se, nunca mais briguem ou eu vou meter a p*****a nos dois! Agora peçam desculpas um para o outro.  — Val, não é assim que funciona... — Cala a boca e pede logo! — Disse Val apertando os dois pela nuca, até que ambos se apressaram em se desculpar. — Pronto, agora vocês conversam e eu vou dormir aqui na cadeira. Ou melhor, vou fingir que estou dormindo para ouvir, se brigarem de novo quebro os dois, se fizerem as pazes é capaz de eu pegar no sono porque vocês são chatos pra caramba!
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