CAPÍTULO | 01

3016 Words
Francine Hoje estou mais do que feliz ! , meu melhor amigo da infância irá retornar para o Brasil novamente , depois de 11 anos . Crescemos juntos , embora eu seja empregada de sua casa; seus pais não tinham distinção de posição social , pelo contrário gostavam até de mim e me pagam uma faculdade , uma das melhores daqui de São Paulo; sou muito agradecida a eles , se não fosse por isso eu realmente não sei o que seria de mim , talvez estivesse jogada a sarjeta com meu padrasto bebum a tira- colo – Não faz nada , bebe o dia inteiro e quando volta é pra vomitar o pequeno quartinho em que eu alugo na favela onde moro em Paraisópoles , é o único lugar onde posso pagar já que nossa casa foi tomada de nós por não ter pago o IPTU quando ainda eu era uma criança e minha mãe ter me abandonado com meu padrasto , nunca mais soube de seu paradeiro e nem sei se ainda me interesso para saber . Nos finais de semana fico aqui na mansão Scozari , e durante a semana eu estudo , quase não tenho tempo pra nada , minha vida é uma eterna correria , mesmo assim divido meu tempo em dar uma passadinha em casa , deixar comida pro mala sem alça do meu padrasto e limpar sua bagunça que parece não ter fim , - Não tenho obrigações com ele , mas também me dá muita pena deixa-lo ao Deus dará . Pra minha sorte ainda tenho minha madrinha Ester , foi ela quem cuidou de mim desde que fiquei órfã . - Vai limpar o quarto do garoto e deixe de ficar com essa cara de boba sonhadora – Recebo um peteleco na minha testa de dona Ester , me fazendo sobressaltar, já que estava debruçada no corrimão da escada pensando na vida . - Eu já limpei e arrumei tudo , até mesmo os quartos de visita – Minha madrinha me estreita os olhos enquanto eu sorrio com minhas sobrancelhas arqueadas massageando o lugar em que ela bitocou . - Acho bom – Resisto a vontade de revirar meus olhos . As vezes ela é bem mandona – Está ansiosa para revê-lo não é ? – Sorrimos uma para a outra em cumplicidade - Sim , já faz tanto tempo . Nem sei se ele vai me reconhecer ainda – Dou de ombros me balançando no meu lugar - Se lembra sim , com certeza ! . Meu menino é um bom garoto , e já deve estar um homem feito e muito lindo – Ela me olha com interesse me cutucando nas costelas - Deixa só o Edgar ouvir isso – Me refiro ao meu namorado Minha madrinha bufa com cara de reprovação , ela não gosta nenhum pouquinho dele , diz que o coitado é um encostado . Eu não vejo m*l algum em ajudá-lo com o pouco dinheiro que ganho , já que ele nunca consegue um trabalho e ainda tem que cuidar de sua mãe que é muito doente . - Me pergunto todos os dias , o que você vê nesse moleque ! – Vou pra protestar mas ela me cala com um dedo em riste – Ainda vai se decepcionar com esse cara , e depois não diga que não avisei – Me emburro cruzando meus braços - Para de me rogar praga madrinha . Deus me livre ! , eu o amo e ele me ama e fim de papo – Não gosto que falem m*l do Edgar se ele não pode se defender . Ela balança a cabeça em negativa pra mim – Espero estar enganada . Agora chega dessa conversa e vamos terminar de arrumar a casa e fazer o almoço , daqui a pouco meu menino chega – Me puxa o braço para acompanha-la enquanto eu rio - A senhora trata o Alexander como se ele fosse ainda um menino - Ela me da uma olhadela feia - E pra mim vai sempre continuar sendo , ele sabe que fui eu quem troquei suas fraldas sujas de merda . – Caímos na risada . *** Eu já não tinha nem unha pra roer de tão nervosa que estava , andava de um lado a outro esperando a campainha tocar e enfim anunciar que o Alex havia chegado ! ,- caramba! , só de pensar que irei rever meu melhor amigo me dá um frio na espinha de tanta ansiedade . E então meu coração pula na minha garganta quando o interfone toca . - Tia Ester é o Alexander – Uma voz grave encantadora surge através dos meus ouvidos . Como seu timbre mudou... , claro né , ele era uma criança quando foi pra Europa estudar e agora é homem feito . Quando enfim consigo despregar meus pés do chão e caminhar até a porta . Minha madrinha surge não sei de onde , passando por mim como em uma maratona de corrida e abrindo a porta e levando as mãos a boca olhando Alexander dos pés a cabeça , enquanto eu perdi meu fôlego . Claro que eu sabia que ele era muito bonito , mas o que ele se tornou agora não existe palavra pra ser colocada como adjetivo , meu queixo está no chão de incredulidade – Meu amigo está um cara irresistivelmente lindo ! , e muito grande , tipo parece mesmo que comeu muito fermento . Minha madrinha é suspendida do chão enquanto os dois entram aos risos e ela chora e ri ao mesmo tempo , enquanto estou estática no meu lugar de olhos esbugalhados . - É tão bom te ter em casa meu menino . – Ela diz emocionada – Olhe só como está ainda mais bonito ! – Ele abre um sorriso escandaloso de bonito pra ela e seus olhos azuis como o mar brilham completando o fenômeno da natureza . - Digo o mesmo Tia Ester – Ele corre os olhos pela sala e para em mim , com curiosidade e um sorrisinho torto toma sua face , quando me analisa dos pés a cabeça – E essa quem é? ... não pera aí , deixe-me adivinhar – Estrala o dedo e aponta com o indicador – Francine? – Os olhos pregados em mim , então se aproxima mais do que eu estava preparada . Caramba ! ele é muito lindo mesmo , parece aqueles modelos de capas de revista . Então sou agarrada de supetão quando ele me dá um abraço de urso e eu inalo seu perfume – Até nisso ele é bom , cheira muito bem . Me pareço muito com uma robô , já que meus braços ficam inúteis e nem retribuir o abraço eu consigo e no entanto logo ele se separa de mim - Poxa! , como você está ... gata . – Seus olhos são brincalhões - O que aconteceu com ela tia Ester ? – Ele vira metade do ombro pra olhar minha madrinha – Não fala mais ? ... - Pare de fazer a estátua e cumprimente o Alexander Francine . Estava toda sagaia de manhã esperando por sua volta e agora ficou tímida de repente . Vai ver é porque se impactou com a sua beleza – Os dois caem na gargalhada - Madrinha para ! – Estou mortificada .- Me desculpe Alexander , é que sei lá , você está diferente , nem parece mais a mesma pessoa Ele faz um biquinho , coisa que nunca mudou , isso reconheço bem- Quando fica pensativo sempre fazia isso enquanto seus olhos semicerram - Isso é bom ou r**m ? - Sobre o que ? – Minha madrinha revira os olhos e bate na própria testa - Sobre eu não parecer a mesma pessoa – Seus olhos azuis me perfuram - Ah .. não claro que não ! . Digo que você esta muito bonito , muito mesmo – Meu rosto esquenta de vergonha . Ainda bem que sou negra - Ah então quer dizer que antes eu era feio ? – Lhe olho horrorizada e ele ri de mim - Alex ! – Lhe dou um tapinha de brincadeira em seu braço - Agora sim ! . Aí esta minha velha e querida amiga . Vem cá , daqui aqui um mega abraço no Alex da Fran – Sorrio pra ele e nos abraçamos fortemente , ele suspira depositando um beijo na minha cabeça e me separando dele me segura nos ombros me olhando nos olhos – Senti a sua falta .- Entorta a boca me encarando muito sério - Eu também senti muito a sua falta . Minha tia pigarreia soltando um risinho estranho - Quer almoçar agora meu filho ? – Ele a olha confuso e coça a nuca de cenho franzido - Vou subir e tomar um banho primeiro .- Então seus olhos se direcionam pra mim – Te vejo depois – Me pisca o olho – Onde estão meus pais ? – Pergunta a minha madrinha Ah! Só agora ele veio se lembrar que tem pais , sinto vontade de rir .Alex não mudou nada - Em uma reunião e só voltam a tardezinha . Eles te deixaram as boas vindas no seu quarto .- Ele faz uma careta e sorrindo pra nós some lá pra cima Corro pra ver se ele não está mais em alcance e volto pra perto da minha madrinha assoviando - Jesus amado ! . Ele está muito bonitão madrinha – Porque minha voz está aguda ? Ela ri concordando - Notei isso . Agora vem me ajudar a colocar o almoço do menino. A porta da cozinha é empurrada fazendo eu e minha madrinha olharmos , ela logo fecha a cara - Edgar o que faz aqui agora? – Falo pra ele arrancando o avental e ignorando o olhar mortal de dona Ester . - Oi gatinha , preciso falar com você – Assinto fechado a porta e deixando atrás de mim o bufar de minha madrinha . - O que houve ? - Tô precisando de grana . - De novo ? , e o que eu te dei na semana passada? – Pergunto de olhos grandes - Tive que arcar com os tratamentos pra minha mãe e agora preciso pra comprar seus remédios – Fico olhando pra ele – Me quebra essa aí neguinha vai . Por favor ! – Juntas as mãos – Quando eu achar um trabalho eu te devolvo tudo , eu juro ! - De quanto você precisa ? – Pergunto - 600 contos – Meu queixo bate no chão - Eu não tenho essa quantia não , só recebo no mês que vem ! - Por favor princesa , arranja aí . É pra minha mãe amor – Seus olhos me cortam o coração . Eu também gostaria de ter uma mãe pra ajudar , mas ela preferiu me abandonar e sumir no mundo . - Espera aí . Vou pegar emprestado com a minha madrinha – Ele assente e eu entro novamente na casa - Eu ouvi tudo . Pega lá na minha carteira – Sorrio alegre pra ela – Minha menina! , toma cuidado com esse cara , pelo amor de Deus . Ele não me cheira a coisa boa . - Vou te devolver seu dinheiro no próximo mês , e a senhora bem ouviu que ele vai me devolver quando começar a trabalhar .- Ela me da um olhar penoso , então sumo de suas vistas . Pego o dinheiro pro Edgar e dou pra ele - Aqui , eu só tenho esse e nenhum mais -Obrigado meu amor . Você é demais – Me da um abraço forte e depois nos beijamos . Ele é tão carinhoso - Te vejo mais tarde ? – Me pergunta - Claro que sim – Sorrio pra ele e lá Edgar vai embora . Solto um longo suspiro olhando pro Céu e pedindo a Deus que abra as portas de emprego pra meu namorado , ele precisa tanto tadinho , ainda mais do que eu . *** Estava no buzu com os fones plugados no meu Samsung mergulhada na música da Iza ''pesadão'' , me remexia até um pouco porque a batida é bem envolvente e de certa forma a letra é minha realidade ,pras pessoas que moram em favelas como eu sofrem muito preconceitos pela sociedade , é como se fossemos o lado n***o da nação ou seja os excluídos , além do mais minha cor de pele não ajuda muito ;n***a , favelada e pobre ,no mínimo é ladrona , é isso que sempre pensam - não que eu me importe , para mim tanto faz , no entanto não significa que não deixe de doer. Puxo a cordinha quando chego no meu destino , me espremendo pelos corpos tentando me esquivar quando é impossível . Ao me vejo fora da lotação , respiro fundo soltando uma lufada de ar recebendo o vento que é bem-vindo , embora esteja um calor sem fim – preciso mesmo de um banho de praia urgente , então o diabinho sopra no meu ouvido '' Até parece que você tem tempo pra isso'' – Então resisto a vontade de lhe dar o dedo do meio ,onde as pessoas que passam por mim poderia achar que estou louca , então me concentro em apenas rolar os olhos e subir ladeira a cima até chegar na quitinete em que moro com meu padrasto . Como já estava acostumada a subir isso aqui desde que me entendo por gente , não me surpreendo quando chego em tempo recorde , um pouco ofegante e mesmo assim passei cumprimentando os vizinhos ;por ser o lugar que é , quase todo mundo se conhece . Nem dei espaço pra começarem a indagar da minha vida , e nem fiz questão pra parar e bater um papo , ainda tinha muita coisa pra fazer e tenho que estudar pra uma prova que farei amanhã no primeiro horário . Quando chego em casa , arrasto as chaves da minha bolsa a destrancando e jogando minha mochila em cima do sofá pequeno que m*l cabe na pequena sala , fazendo uma careta quando dou de cara com meu padrasto Kenedi esparramado no outro sofá de braços abertos , sendo que um se arrasta quase pelo chão , está de boca aberta e o m*l cheiro de bebida e álcool inunda por toda a sala. Marcho até a cozinha apertada pegando tudo que preciso pra fazer uma faxina na casa , aproveitando do desmaio alcóolico dele . É sempre assim , vive nessa vida e nunca toma vergonha na cara pra se levantar e procurar algo bom pra se fazer na vida , ao invés de passar a semana dentro de um bar enchendo a cara . Se não fosse por minha madrinha , eu realmente não sei o que seria de mim ; por os Scozari serem um casal de juízes , eles conseguiram passar minha guarda pra minha madrinha Ester me salvando dessa vida ao lado de Kenedi , ele é um bom homem , só esta perdido na vida , desde que minha mãe nos abandonou. Quando estou pegando a última remessa de lixo e jogando na lixeira, encontro uma garrafa vagabunda de 51 debaixo do forro do sofá ; isso foi mesmo uma tentativa de esconder a cachaça? – Minha mente é sarcástica . Então Kenedi resmunga algumas palavras incoerentes e abre os olhos se deparando com os meus irritados pra ele . O mesmo faz uma careta se ajeitando pra sentar no sofá, m*l dando conta de fazer isso , enquanto eu fico olhando seu ''espetáculo'' bebum . - Que horas você chegou?- Sua voz soa embolada , passo por ele levando o lixo pra cozinha pra pôr num saco maior pra jogar fora. - Há tempo suficiente – Jogo uma cartela de aspirina pra ele , este olha pra sua mão de testa franzida e pra mim de volta - Pra que isso ? – Arqueio uma sobrancelha pra ele - Vai precisar de alguma coisa pra sua ressaca . Ou talvez nem precise mais , já que a bebida faz parte de seu sistema digestivo . Ele comprime os lábios numa linha fina ficando em silêncio e baixando as vistas , pela minha alfinetada Bufando vou até a geladeira velha , crendo que ela tem bem a minha idade , pegando a garrafa com uma caneca que fica numa bandeja acima dela e trazendo pra ele . - Obrigado – Agradece depois de ingerir o comprimido - Precisa de mais alguma coisa? – Presto atenção nele – Comeu alguma coisa? , posso fazer alguma coisa pra você . – Porque eu sou tão boba com esse cara? - Não precisa , estou sem fome . Mas agradeço – Balanço minha cabeça para cima e para baixo de forma monótona , pegando minha mochila de cima do sofá pequeno e passando por Kenedi até o meu quarto . - Como vai seu estudo ? – Ele está mesmo querendo dialogar comigo ? Freio meus passos e ando mais uns ficando no seu campo de visão - Está querendo mesmo conversar neste estado ? – Não pude evitar a aspereza na minha voz . Me dá muita raiva , ver uma pessoa se destruindo ao invés de lutar pra sair do buraco em que se encontra . Ele resmunga alguma coisa que eu não ouço mais , pois já tinha batido a porta do meu quarto e ainda passado a chave . Por várias vezes Kenedi roubou dinheiro de mim pra beber no barzinho da esquina se aproveitando das poucas horas de cochilo que eu tirava, quando já não aguentava mais estudar e acabava caindo no sono . A apostila parecia não ter fim , faço faculdade de '' Assistência Social '' e não aceito nada menos que tirar uma nota no mínimo satisfatória .
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