Omar

941 Words
O aperto no peito se intensifica. — Mãe, chega desse vídeo! Que tal um cafezinho? — tento mudar o foco, precisando de uma pausa dessa mistura de saudade e dor. — Vou fazer — responde minha mãe, enxugando os olhos marejados enquanto troca um olhar com meu pai, que permanece em silêncio. Algo na atitude dela me deixa alerta. — Precisamos conversar. Sente-se — diz meu pai com uma expressão séria. Meu coração dispara. Quando ele assume esse tom, sei que vem algo importante, e geralmente não é coisa boa. — O que foi? — pergunto, tentando parecer tranquila, mas já sentindo o peso da ansiedade. — Há uma semana, Omar nos ligou. Fico perplexa ao ouvir o nome do meu ex-namorado sair dos lábios de meu pai. — Pai! Deus! Esquece esse homem. E daí que ele ligou? Por que está me contando isso agora? Meu pai suspira profundamente, ignorando minha reação. — Não seja dura com ele. — Dura com ele? Por que essa conversa agora? Ele está do outro lado do mundo. Nem se lembra mais de nós! — Filha! Ouça. Eu reviro os olhos, mas cruzo os braços e me recosto no sofá. — Tudo bem, pai, mas fala logo. Combinei com Leonardo de sair. — Leonardo? O mecânico? Ah, não... Essa implicância! Eu detesto isso! E daí que o cara é mecânico? — Sim, pai. Ele mesmo. — Eu convidei Omar para passar o Natal conosco. Sinto um baque no peito, como se tivesse levado um soco. — Como? — E ele aceitou. As palavras ecoam na minha cabeça, misturadas a uma confusão de emoções que m*l consigo processar. — Pai, como o senhor convida Omar para o Natal sem me consultar? Minha voz quase falha. Tudo parece injusto ultimamente. Primeiro Tiago. Meu irmão morreu há alguns meses com uma bala perdida e minha mãe entrou em depressão e está difícil sair dela. —Pai! Você não podia ter feito isso! —Choramingo. — Ele é como um filho para mim e para sua mãe — meu pai insiste, a voz carregada de emoção. Eu respiro fundo soltando o ar com um ultrajado furor. — Pai... Tiago se foi. O senhor não percebe o que está fazendo? Está colocando Omar no lugar dele. — Não é nada disso! — meu pai eleva o tom, irritado. — Eu gosto de Omar e ele sempre gostou da gente. — Tanto que nunca mais apareceu — retruco, com amargura. — Ele ligou todo os meses para saber de nós e de você. Engulo em seco, processando a revelação. — Ele ligou? E o senhor nunca me disse nada?! — Ele não permitiu que eu te contasse. Uma mistura de raiva e confusão me invade. — Então ele virá? — Sim, ele chega hoje dos Emirados. Na verdade...ele nos visitará hoje. O quê? O mundo parece sair de eixo por um momento, mas antes que eu possa reagir, ouço uma voz familiar. — Boa tarde a todos. Deus! Meu pulso acelera quando eu ouço a voz tão familiar com aquele sotaque forte. Eu me viro lentamente e dou com Omar parado na soleira da porta. Minha frequência cardíaca aumenta e a todo custo tento manter minha respiração sob controle. Agradeço aos céus por meus lindos olhos azul-esverdeados estarem escondidos atrás dos óculos de sol e ele não conseguir enxergar a intensidade do meu olhar para ele. Reparo na sua barba semicerrada com nenhum fio fora do lugar. Contrariada admito sua aparência só melhora com o passar dos anos. Os cabelos castanho-escuros estão bem penteados para trás. Seu físico continua perfeito. A roupa esporte elegante deixa claro isso. Tiro o óculos escuros e olho para o meu pai aturdida. Deus! Claro! Meu sabia que ele estaria aqui hoje. Foi tudo combinado entre eles. O vídeo foi só para ele conseguir tocar no assunto. Volto meus olhos para o homem que amei durante tanto tempo e que colocou sua carreira acima do nosso relacionamento. — Desculpa ter entrado assim, mas o portão estava aberto — diz Omar em tom leve e despreocupado. Típico dele. Sempre aparecendo de surpresa, sem aviso. Não consigo evitar que memórias de nós dois invadam minha mente, mas rapidamente as descarto. Isso é passado. — Omar. Imagina, você é de casa — diz meu pai, emocionado, abraçando-o calorosamente. — Obrigado. O senhor também está muito bem — responde Omar, sorrindo, antes de erguer os olhos para mim. — Oi, Sofia. A amargura me domina, lembrando-me de todas as mágoas que carreguei desde que ele escolheu sua carreira em vez de nós. — Oi, Omar — respondo friamente, erguendo o queixo. Meu pai percebe o clima tenso e tenta intervir: — Sente-se. Eleonora está fazendo um cafezinho. Está sentindo o cheirinho? — Eu aceito uma xícara — diz Omar, sorrindo novamente. Ouço a buzina lá fora e me levanto, agarrando essa oportunidade. — Bem, fique à vontade. Eu estou de saída. Antes que eu possa dar outro passo, Omar diz, com firmeza: — Não vá. Fique. Engulo em seco, sentindo uma onda de emoções conflitantes. — Não posso. Tenho um compromisso. —Filha, sente-se. Omar quer conversar com todos. Escute-o. Eu pisco. —Pai, eu não posso, eu já disse. Tenho... Minha mãe aparece carregando a bandeja com as xícaras. — Sofia! — Ela me interrompe com um tom firme, e eu sei que não há como escapar. Jogando-me de volta no sofá, cruzo os braços, impotente. — Omar, é um prazer em te ver aqui. Sente-se! — Ela diz, mais calma, carregando a bandeja com o bule e as xícaras. Três xícaras. Sim, ela sabia que ele viria.
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