03

2000 Palavras
ISADORA NARRANDO. Continuei ali do lado da minha mãe, aproveitando cada segundo ao lado dela, porque eu sabia que seria o último, e que depois de toda terra jogada em cima dela naquele cemitério, mais do que nunca, seria eu por mim mesma. Não é fácil, mas Deus sabe de todas as coisas, e é exatamente nesses momentos que encontramos com uma fortaleza que na maioria das vezes nem imaginamos que temos, e que realmente existe dentro de nós. Minha mãe estava muito diferente, bem amarela, gelada, e já nem dava mais para sentir o seu perfume, muito menos ouvi-la gritar comigo pra não sair de casa com um short tão curto. Todos esses anos depois que ela conheceu esse maldito desse Carlos, eu via o brilho dela sumindo dia após dia, e ela ia se tornando exatamente aquilo que ele queria que ela se tornasse, e em cada um desses dias, ia se distaciando um pouco mais de mim, porque segundo ele, tudo que eu contava para ela tinha um único objetivo: fazer ela terminar com ele. O amor deixa as pessoas cegas, eu sempre acreditei que isso poderia ser verdade, mas eu vi que de fato era muito mais do que verdade, quando comeceia a conviver com situações dentro da minha própria casa, e o tempo todo me manter ali, forte, e ao mesmo tempo que eu tinha ela, eu estava sozinha. Talvez já poderia ser Deus me preparando para viver sem ela, mas ao mesmo tempo, essa mesma situação me faz pensar: até quando eu vou precisar viver esse tipo de coisa? Apanhar na cara, ser humilhada diariamente, e na maioria deles, além de tudo não ter nem o que comer. Mas tudo acontece no tempo certo, e eu tenho certeza que de lá do céu a minha mãe estará comigo, e que o quanto antes eu vou me livrar do Carlos, tenho fé nisso. Segurando firme na mão da minha mãe, o tempo todo ali do lado do caixão, e ele do outro lado, também sentado, assim como eu. Me olhando com um olhar m*****o, o mesmo que eu já estava acostumada a ver, e que dia após dia já não me amedrontava mais, graças a Deus. Vi o Sr. Antônio entrando pela porta, veio até mim e me deu um abraço. Depois ficou bem quietinho sentado nas poltronas que tinha um pouco atrás de onde eu estava. Não trocou uma palavra sequer com o Carlos, até porque ele já sabia tudo o que se passava, e ninguém daquela rua gostava dele. Todo mundo enxergava, menos a minha mãe. Da mesma forma que o Sr. Antônio agiu, as outras pessoas que moram na nossa rua, e que resolveram passar por ali também agiram. Ninguém trocou uma palavra sequer com o Carlos, mas o olhar deles era um olhar muito além do que o que eu imaginava, era um olhar de repulsa muito maior do que o normal, porque gostar dele verdadeiramente eu sei que nunca gostaram, porém era muito mais que isso, parecia e eu também conseguia sentir que ele tinha feito alguma coisa um pouco mais grave por aí, quem sabe até pela vizinhança, e eu ia descobrir. Mas não agora. Vieram várias pessoas prestar condolências para mim, acho que é assim que fala, quando você sente muito por algo, ou quando alguém morre. Porém tudo aquilo estava me irritando, eu só queria ficar tranquila com a minha mãe ali, sem muito abraço e beijo, porque na hora do "vamo ver" mesmo, é só eu. Ninguém se propõe para ajudar com algo, e isso porque todo mundo sempre soube de tudo que acontecia, e pelo jeito sabem até um pouco mais do que eu mesma, porque nada tira da minha cabeça que o Carlos aprontou alguma coisa. Veio uma menina até mim, éramos amigas quando crianças, porém depois que ela começou a namorar esqueceu que tinha amiga, ele traia ela na cara dura, todo mundo do bairro sabia, e quando a tonta aqui foi falar, ainda riu da minha cara. Então eu simplesmente deixei de falar, de conviver ou de qualquer outra coisa do tipo, cortei qualquer vínculo possível. Ela entrou pela porta, se aproximou mais ainda de mim e disse: — Fabíola: Oi Isa, como você está? Eu sinto muito viu? - Disse ela tentando me abraçar. Continuei de braços abaixados, como quem não queria ser abraçada, muito menos por ela, e respondi da forma mais seca e irônica possível dizendo: — Isadora: Pra você é Isadora, por favor. Não tem p***a nenhuma de Isa não. E como você acha que eu tô? Tô super feliz não ta vendo na minha cara? Pergunta mais i*****l mano. Ela ficou me olhando com uma cara de assustada, de quem realmente não esperava que eu dissesse isso, e depois me respondeu: — Fabíola: Tudo bem, eu entendo você e sei que esse é um péssimo momento para que eu pudesse vir, mas eu só queria saber como cê tava, sinto muito pela dona Sandra. — Isadora: Ok, já entendi que sente muito, agora pode me deixar aqui na minha de boa? Ela não respondeu nada, apenas saiu andando e escutei ela dizendo pra mãe dela que eu realmente não ia perdoar ela tão cedo. Aliás, o pouco que olhei na cara dela eu pude perceber que tá com o olho roxo. Acho que gosta de apanhar, e ainda por cima é traída para que o bonde todo fique sabendo. De repente chegou um amigo do Carlos, outro lixo assim como ele. Eu olhei pro Sr. Antônio e eu pude ler nos olhos dele que era pra eu ficar quietinha na minha, e sem fazer nada. Mas era só o que me faltava, o Carlos trazer esses lixos como ele aqui no momento da minha mãe, onde pelo menos nesse eu esperava que ele a respeitasse, já que fazia o oposto disso todos os dias. Fiquei quietinha e eles começaram a conversar, até que ouvi o moço perguntando para ele o porque ele não tinha avisado antes, que ele poderia ter vindo ou até dado uma carona pra ele. Em alto e bom tom, o Carlos respondeu, para que todo mundo pudesse ouvir: — Carlos: Eu não te avisei antes porque nem eu fiquei sabendo antes, ta ligado? Essa vagabunda aí não me respeita nem no momento da morte da mãe dela, minha parceira que mais me amava criou essa cobra que mais me odeia. Sendo que eu sempre fiz de tudo pra ela mano. - Disse ele me encarando cada vez mais, e apontando o dedo pra mim. Aquela hora eu saí de mim, não pensei duas vezes antes de responder alguma coisa pra ele, eu estava o tempo todo ali na minha fingindo que ele nem estava ali, e esse cara vem querendo me tirar no velório da minha própria mãe? Então eu disse: — Isadora: Já que tu é tão f**a assim como diz ser pra todo mundo, porque não honra com o p***o que tem no meio das suas pernas e vai trabalhar? Pelo menos pra manter os seus vícios e colocar comida dentro de casa? - Respondi ele já chorando de raiva. O Sr. Antônio tentou me segurar, mas eu fui mais forte e consegui me soltar, e fui até o outro lado onde ele estava sentado. Continuei gritando com ele e apontando o dedo na cara dele, gritando cada vez mais. ALERTA DE GATILHO! ALERTA DE GATILHO! ALERTA DE GATILHO! Até que ele se levantou e antes de dizer qualquer coisa, me deu um tapa na cara, e aquele tapa não teve dor física, apesar de muito forte, como ele sempre fez, mas aquele momento me doeu na alma, era uma coisa realmente muito revoltante pra mim. Ele não me respeita, em momento algum, e a partir desse momento eu esqueci mais do que nunca toda e qualquer possibilidade de fazer a minha relação com ele ser saudável. Por mais que eu já enxergava isso como uma coisa completamente impossível. Foi horrível. Me senti humilhada, no meio de todo mundo, e acima de tudo, sem respeito algum ali naquele momento que seria o último com a minha mãe. Sr. Antônio veio até mim, pegou no meu braço e um pouco bravo comigo me tirou de dentro da sala onde minha mãe estava sendo velada. Foi horrível mesmo. Mas todo mundo ficou olhando e não fez absolutamente nada. Sr. Antônio me levou pra beber uma água, e parecia que nem a água ia descer, estava entalada de ódio e muita revolta. Mas em respeito pela minha mãe eu respirei fundo e decidi que iria ficar na minha. — Sr. Antônio: Você não pode enfrenta ele assim minha filha, você sabe que ele é descontrolado, ainda mais bêbado. Imagine só o que ele é capaz de fazer quando tiver só vocês dois. — Isadora: Se tem uma coisa que ninguém jamais imaginou é do que o Carlos é capaz de fazer. Ninguém faz ideia dos corre que eu preciso fazer, e de tudo que eu passo dentro daquele inferno de casa. Depois disso ele me abraçou e eu chorei. ALGUMAS HORAS DEPOIS, JÁ NO DIA SEGUINTE ~ Amanheceu, a noite passou rápido demais. Sr. Antônio não aguentou e precisou ir embora descansar, e disse que voltaria hoje. Ficamos sozinhos praticamente a noite toda, mas o Carlos passou a maior parte do tempo dormindo, tinha levado um corote dentro do bolso, e deu vários goles até ver a garrafa vazia. Ou seja, ficou louco mais uma vez e capotou. Ali mesmo, sentado. E eu na minha, bem quietinha apenas pensando sobre várias coisas ao mesmo tempo, até mesmo sobre o tal site que eu tinha visto para ganhar dinheiro fácil e rápido. Sei que não é o momento certo, mas assim que chegar em casa eu já ia ver sobre isso, preciso ajudar um jeito de me manter, fazer os meus corres e conquistar o meu, porque ninguém vai fazer isso por mim. Os mesmos homens que trouxeram o caixão da minha mãe entraram pela porta, já faltavam quinze minutos para as oito horas da manhã, chegou o momento da despedida da despedida. Um dos piores momentos, com toda certeza desse mundo. Fecharam o caixão da minha mãe, e eu só sabia chorar. Sr. Antônio não voltou, acredito que tenha perdido a hora de acordar, era só eu por mim mesma ali, assim como seria do dia de hoje em diante. Entrei no carro junto com o caixão, porque eu não tinha nem uma bicicleta, para ao menos conseguir acompanhar o cortejo. Ninguém do bairro veio, apenas eu, Carlos e os funcionários estavam ali. Chegando no cemitério, pedi que fossem rápidos, para conseguir parar de prolongar esse sofrimento. E assim fizeram. Em um buraco cavado de qualquer jeito, no chão mesmo, como se fosse enterrar qualquer coisa, colocaram o caixão da minha mãe. Conforme eu via a terra caindo, via a escuridão tomando posse, não só da minha mãe ali, mas dentro de mim também. Depois que terminaram de jogar terra por cima, bateram um pedaço de madeira, fazendo uma cruz de qualquer jeito. Tudo parecia ter sido feito de qualquer jeito. Carlos não derramou uma lágrima se quer. Eu virei as costas e saí. Na minha e sozinha. Ia procurar o ponto de ônibus mais próximo para poder voltar pra aquilo que chamo de casa. Mas se tem uma coisa que eu senti quando pisei o pé pra fora do cemitério, foi que eu precisaria voltar para reformar o túmulo da minha mãe. Ela não merece ser tratada como uma indigente, colocada em um montinho de terra qualquer. E assim eu iria fazer, e estava disposta a dar o meu sangue por isso! Gente e agora? O que vocês acharam desse capítulo? O que vocês acham que vai acontecer? Vocês já me seguem no i********:? Ainda não? Poxa, então corre lá e me sigam Aut.GabiReis Adicionem o meu livro na biblioteca clicando no ❤
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