Prefácio - Capítulo 01

3004 Words
   PREFÁCIO       Você já parou para pensar nos momentos disfarçados de presentes que a vida nos proporciona?Você já encarou seus amigos, seu trabalho e tudo que tem como um presente? Já percebeu que até os momentos difíceis nos trazem presentes? Pois é, nós também não...                     ...até nossos caminhos se cruzarem.              CAPÍTULO 1Thais        Rolo na cama procurando o celular ao ouvir o toquinho chato do despertador bem longe... bem baixo... — Só mais cinco minutinhos... — digo para mim mesma. Resolvo ignorar por 5 minutos a musiquinha irritante e adormeço novamente. O que é uma péssima ideia! De repente acordo assustada e dou um pulo na cama jogando a coberta para o lado. Olho em volta com o coração disparado. Tateio a cama a procura do celular e o encontro embaixo do meu travesseiro. Aperto o botão da lateral do aparelho e quase tenho um infarto quando consigo focar a visão e ver a hora.     — Caramba!!! A Cassandra vai me m***r! São 8h e eu ainda estou aqui. Pulo da cama tropeçando nos meus sapatos, que estão jogados no meio do quarto. Se minha mãe visse essa bagunça aqui provavelmente me mataria. Eu preciso arrumar esse quarto com urgência. Uma vez li uma reportagem em um site que dizia que a nossa organização reflete como está a nossa vida. Olhando para o meu quarto eu tenho certeza que a reportagem é verdadeira. Tudo não poderia estar mais catastrófico. Parece que o Taz Mania passeou por aqui e revirou tudo, no quarto e na minha vida!   Desvio de algumas caixas de sapatos que estão no chão e saio em disparada pelo corredor. Chego em frente à porta do banheiro que está fechada. Victor está no banho e canta em plenos pulmões. Esmurro a porta insanamente e de lá de dentro, ouço uma gargalhada. — Pelo amor de Deus Victor! — Bato na porta com mais força. — Eu estou muito atrasada. Anda logo aí! Da última vez que me atrasei, fui obrigada a limpar o escritório todo com uma flanelinha. Dessa vez a Sra. Cassandra vai me obrigar a limpar as mesas com a língua. — Victoooor!!! — Soco a porta novamente. Meu amigo abre a porta rindo, enrolado com uma toalha em sua cintura e o corpo ainda molhado. — Querida, o que está acontecendo aqui? — ­­­­­­­Ele ergue as mãos no alto fazendo drama — A terceira guerra mundial começou? Ou é uma invasão zumbi? — O engraçadinho abaixa a cabeça na minha altura e olha para os dois lados do corredor procurando por algo ou alguém. Victor é meu melhor amigo desde sempre. Desde que me conheço por gente ele está ao meu lado, nos momentos felizes e principalmente, nos momentos tristes. Ele é lindo, aquela beleza natural, sua pele é bronzeada naturalmente o que me causa inveja toda vez que inventamos de ir à praia. É alto, algo em torno de uns 185cm, cabelos lisos, loiros e bagunçados, olhos verdes claros como uma piscina, e corpo definido. O sonho de consumo de todas as garotas. Porém, Victor é gay!  Eu acho... mais ou menos …  Ele não assume para todas as meninas que correm atrás dele e nem para mim, mas eu desconfio. Meu amigo é muito reservado nos seus assuntos particulares. Eu nunca sei quando ele está namorando, ficando, ou conhecendo alguém. Nós dividimos o apartamento e as contas desde quando ele saiu da fazenda de seus pais e apareceu aqui na minha porta durante a madrugada de malas nas mãos. Na época não questionei o motivo, mas sei que foi por algum problema com seu pai. Uma semana depois ele começou a trabalhar no mesmo shopping que eu e aí o convenci a ficar aqui de vez. Eu sou recepcionista do escritório da gerência geral e ele trabalha em uma loja de artigos esportivos. Empurro Victor para o lado e entro correndo no banheiro. Escovo os dentes e lavo o rosto evitando me olhar no espelho. Não dá tempo de tomar uma ducha e se eu me olhar no espelho agora, sei que meu reflexo vai gritar: “Banho, sua louca!” Saio correndo para meu quarto e pego a primeira calça que vejo, ergo-a na minha frente examinando-a se está limpa. Apesar de estar jogada no pé da cama parece estar sem uso, e é ela mesmo que vou vestir. Pesco uma blusa limpa na pilha de roupas que cai quando abro o guarda roupa e apanho minha jaqueta que também estavam no chão, calço meus sapatos favoritos, os mesmo que eu tropecei quando levantei. Paro em frente ao espelho para iniciar minha batalha diária que é domar meus cabelos. Eu o amo, mas ele definitivamente não tem o mesmo sentimento por mim, disso eu tenho certeza!  Passo a escova tentando arrumar os fios, mas não dá certo.  Agora, atrasada do jeito que estou, não consigo ficar alisando e nem domando os fios arrepiados que se formaram por eu ter dormido com ele molhado ontem.  Faço um r**o de cavalo alto, e me viro de lado me olhando no espelho.  Vai ter que servir!  Pego a bolsa e passo pelo corredor a passos rápidos. Victor está parado no meio da cozinha totalmente pronto, bem vestido, perfumado e sorrindo.  Que vontade de socar sua cara linda! Se eu não estive tão atrasada, eu ia fazer questão de quebrar seu nariz. — Posso saber por que tanta pressa mocinha? — Ele me olha com as sobrancelhas erguidas. — Cassandra mudou meu horário hoje, lembra? — Estico-me alcançando em cima da geladeira e pego o pote de ração de Tedy, meu gatinho que vem se esfregando em minha perna quando me vê. — Hoje entro as 8h. — Entrava querida! Já são 8h20min. — Mais uma vez, ele ri de mim em menos de vinte minutos. — Eu entro as 9h30min hoje. Eu me atrapalho procurando a chave na minha bolsa e a deixo cair esparramando minhas coisas pelo chão. Abaixo-me, junto tudo e jogo dentro da bolsa de qualquer jeito. — Vamos sua louca! Eu te dou uma carona. —Levanto-me e Victor me olha de cima a baixo e o sorriso em seu rosto aumenta. — O que foi agora? — pergunto sem paciência.  —  Credo! Você já se vestiu melhor. — Reviro os olhos para ele, pego a chave de sua mão e abro a porta saindo.  Meu amigo sempre que tem oportunidade, critica minhas roupas e meu cabelo, e esse é um dos motivos para eu acreditar que ele é gay. Nenhum outro cara que eu conheço entende tanto de moda como ele. A maioria não cuida nem dá própria roupa, e acredita que lavar o cabelo com sabonete já o suficiente.  — Caramba, esse elevador sempre demora quando eu mais preciso dele!  Aperto o botão na parede incansavelmente até meu dedo doer, achando que assim ele subirá mais rápido. Ouço o barulho da câmera fotográfica do celular de Victor e me viro estreitando os meus olhos para ele. — O que você está fazendo? — pergunto tentando alcançar o celular em sua mão.  — Estou documentando o desastre do seu look de hoje e vou mandar para a Rafa. Com certeza ela me dará razão... Esses dois têm conversado muito ultimamente, principalmente se o assunto for a minha vida. Eles até andaram saindo sem mim. Não me importo, eu gosto de ver os dois juntos, desde que me deixem em paz. Quando eu ia discutir o elevador chegou e eu entrei correndo, deixando Victor para trás. Ele entra no elevador e se encosta ao meu lado entretido em seu celular. Aperto o botão do térreo com a mesma insana pressa. Sr. Ivo, meu vizinho do andar de cima, está no elevador e me lança aquele olhar fulminante que só ele é capaz. Encolho a mão e a coloco no bolso da jaqueta. Tento sorrir para ele, mas o olhar zangado continua ali me avaliando. Acho melhor abaixar a cabeça e nem chegar perto do botão novamente. Graças a Deus, chegamos a garagem! Passo correndo pelas portas, tropeçando e trombando com Sra. Cecilia minha vizinha do 401, quase derrubando a pobre senhora de costas. Sorrio e me desculpo, mas não tenho tempo de parar para conversar. Toda vez que ela me vê gosta de falar e falar sem parar. Victor me segue olhando para o celular alheio ao mundo a sua volta e a minha possível demissão por estar muito atrasada. Estamos próximos a vaga do estacionamento e meu celular começa a tocar dentro da bolsa. Enfio a mão lá dentro revirando tudo até encontrá-lo na minha bagunça. Olho em seu visor e vejo a minha foto em frente ao elevador e abaixo uma mensagem de Rafaela. Rafa é a rainha do bom humor e minha amiga desde o ensino fundamental. Sua alegria é contagiante. É aquele tipo de pessoa que acorda às 5h da manhã para saudar o sol e conversa com as árvores. Seus cabelos ruivos estão sempre bagunçados e nela isso é lindo! Seus olhos castanhos claros são o toque em sua beleza e se destacam na pele clara. Ela é mais alta que eu, e isso para ela, também é motivo para me tirar a paz. Além de implicar com a minha altura, ela arruma tempo para implicar com as minhas roupas, e recentemente decidiu que eu preciso de um namorado.   Rafa:> Amiga do céu!  O que está acontecendo com o seu guarda roupa?  Não respondo e jogo o celular na bolsa novamente enquanto dou uma cotovelada em Victor que se encolhe rindo. Meu amigo m*l desativa o alarme e eu me jogo dentro do carro e coloco o cinto de segurança. Pesco o celular novamente dentro da bolsa e olho a hora. 8h30.  Estou mesmo ferrada!     — Victor pelo amor de Deus, acelera — peço olhando para meu amigo que mantém a postura ereta atento a saída do estacionamento     — Querida, não vou cometer nenhuma infração só porque você tem problemas com o seu despertador. — Victor me encara por um segundo, erguendo as sobrancelhas e volta a olhar para o trânsito a sua frente. O tempo está nublado anunciando mais chuva. Não para de chover há cinco dias. E a temperatura só tem caído. Passo as mãos pelos braços para me aquecer sentindo meu corpo gelado. Estendo a mão para ligar o aquecedor e Victor a segura. — Nem pense nisso! — Eu encolho a mão e cruzo os braços, bufando. Se tem uma coisa que Vitor ama no mundo, é seu carro! Ele não deixa ninguém tocar em nada. Uma vez tentei persuadi-lo para que me emprestasse o carro e, ele além de não me emprestar, fez eu ir até a fazenda de seus pais que fica a 200km de casa, de ônibus. Fiquei dois dias sem falar com ele por causa disso. Não por causa de não emprestar o carro, mas por me fazer ir a pé da porteira até a casa, alegando que seu carro não foi feito para ser usado em estradas de terra. Chegamos ao shopping às 8h40min. Victor manobra para entrar na garagem, mas encontra uma fila de carros para acessar o estacionamento do subsolo que é reservado aos funcionários. Salto do carro ouvindo meu amigo gritar meu nome, mas não paro e nem olho para trás. Corro em direção as portas de entrada do shopping, mas não antes de levar um banho de água suja.  A chuva do dia e da noite formou poças de água e lama na rua e um filho da mãe passou por uma espirrando, não só água que estava parada na sarjeta, mas a lama também em mim. — OBRIGADA CRETINO!!! — grito sentindo a raiva crescer dentro de mim. Ótimo! Agora além de estar muito atrasa, estou suja e fedendo cachorro molhado. Sinto vontade de sentar na sarjeta e chorar, mas não tenho tempo para isso. Preciso dar um jeito de manter meu emprego e acalmar Cassandra que deve estar p**a comigo.  Se ela não me m***r hoje, não me mata nunca mais! Passo correndo com os meus saltos de 10cm fazendo barulho contra o piso do saguão do edifício ouvindo o Sr. Pascoal rir. Sr. Pascoal é um senhor na casa dos 70 anos, com um sorriso enorme e cativante que trabalha na recepção do shopping. Ele sempre está ali independente do horário que eu chegue ou saia. Pensando bem, eu desconfio que ele faça parte da mobília ou da decoração. Suas roupas até combinam com os móveis. Sempre que eu me atraso ele ri, pois sabe que Cassandra fica uma fera. Eles são amigos de infância, ou seja, amigos a muito, muito, muito tempo mesmo. Alcanço o elevador que, graças a Deus, está parado. Enquanto ele fecha as portas e sobe eu rezo para que Cassandra esteja de bom humor. Chego ao sétimo andar e respiro fundo, indireto a postura e assumo a minha versão profissional séria. Saio do elevador sustentando um sorriso, mas sinto-o morrer e estreito as sobrancelhas, desconfiada. O corredor de paredes claras está deserto e gelado. Estranho o fato de Cassandra não estar me esperando de braços cruzados e cara f**a como sempre faz quando eu me atraso. Sr. Pedro, esposo de Cassandra é um homem muito bom. Eles trabalham juntos na administração do shopping. Meu pai trabalhou para ele a vida toda, e ele praticamente me adotou após a tragédia que aconteceu na minha vida.  Eu perdi meus pais em um trágico acidente de carro quando eles retornavam para a cidade, após me deixarem na fazenda de Victor para as férias de julho. Eu tinha apenas 16 anos e me vi sozinha no mundo. Mas Sr. Pedro e Cassandra me ampararam. Eles me estenderam a mão, me deram um emprego. Ajudaram com a papelada da minha emancipação, do seguro e com a compra do meu apartamento. Levavam-me comida quando eu só conseguia chorar, e mobiliaram o meu novo lar. Eu não conseguia mais entrar na casa que vivi a vida toda sabendo que meus pais não estariam ali. Eles até me convidaram para morar com eles, mas eu não queria atrapalhar e não me senti confortável com a ideia. Passei um tempinho na fazenda dos pais de Victor, e após comprar meu apartamento, fui morar sozinha com Tedy, meu gato preto de olhos amarelos lindos.  Nunca mais pisei no local onde passei a minha vida toda com meus pais. Sr. Pedro se encarregou da venda da casa. E se hoje eu consigo me sustentar e ter uma profissão é graças ao meu chefe roliço e já idoso e a sua esposa exigente, que a essa altura deve estar encomendando meu funeral.      Abro a porta do escritório e espio lá dentro. Não há sinal do Sr. Pedro ou de Cassandra, mas Rebeca já está ali, sentada e impecável em sua roupa perfeita. Ela me olha espiando dentro do escritório e revira os olhos. — Anda logo! Você está atrasada— ela diz e eu sinto vontade de socar a carinha perfeita dela. O dia começou para mim tem menos de 40 minutos e eu já quis socar umas cinco pessoas. Realmente estou violenta hoje!  — Na sala do Sr. Pedro tem uma novidade e é melhor... — Rebeca diz, mas eu passo por ela sem ouvir o que ela está dizendo e imagino que ela esteja rindo para o computador ao ver a minha confusão. Rebeca trabalha comigo a pouco mais de três anos. Temos a mesma idade e convivemos cinco dias por semana, mas mesmo assim não conseguimos ter uma conversa onde ela conte algo sobre a sua família ou sobre a sua vida fora daqui. Ela se esquiva e sempre muda de assunto. Rebeca é muito bonita, mas muito reservada, completamente diferente de mim e de Rafaela. E se para ela está okay ser assim, para mim também está. Atravesso recepção correndo e paro somente para deixar minha bolsa sobre o armário. Entro no corredor e empurro a porta do banheiro, pego a toalha de rosto e passo no meu corpo tentando secar meus cabelos e minha roupa.  Olho-me no espelho e me desanimo. Eu estou um caos! E eu achando que meu cabelo não podia ficar pior! Agora além de arrepiado, está molhado e sujo.      Respiro fundo e me encaro no espelho, faço a minha melhor cara de cachorrinho que caiu do caminhão da mudança. Testo as minhas expressões faciais e deixo minha postura cair. Serei demitida e se eu demorar mais aqui, Cassandra me jogará pela janela. Saio do banheiro e bato na porta da sala do Sr. Pedro ensaiando minha maior desculpa. Abaixo a cabeça e vejo a luz que passa por baixo da porta indicando que ele já havia chegado. Força Thais, você consegue convencer ele que se atrasou sem querer.       Bato na porta, esperando ouvir a voz de Sr. Pedro ou a voz de Cassandra, aquela voz fina e estridente que grita meu nome quando eu sem querer -lógico - faço alguma m***a. — Pode entrar! — diz uma voz grossa e calma de dentro da sala. Eu já estou empurrando a porta quando me dou conta de que aquela voz não é do Sr. Pedro. Será que Sr. Pedro está gripado?  Engulo em seco e abro a porta. Fico paralisada e engulo em seco umas três vezes. Sinto meus olhos crescem nas órbitas e prendo a respiração.       Sentado no lugar do Sr. Pedro, há um homem não muito mais velho que eu, deve ter uns 27 ou 28 anos. Muito bonito... Muito, muito bonito! Ocupa a cadeira e toda a sala com sua presença. Com os cabelos escuros, desarrumados daquele jeito que faz os dedos coçarem para passar por ali, a pele clara e olhos tão azuis quanto o céu de verão em pleno meio dia, e muito bonito. Já falei que ele é bonito? Ele me olha e sorri, exibindo uma fileira de dentes brancos perfeitos. Eu fico hipnotizada nesse sorriso. E graças a Deus, estou de boca fechada, senão estaria babando.                       
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